domingo, 9 de janeiro de 2011

Conteúdos e progressão dos conteúdos no ensino de História (2): as potenciais contribuições dos teóricos do desenvolvimento (Jean Piaget)


Detalhe da capa de Lições do Rio Grande (Livro do Aluno). Porto Alegre: Secretaria de Estado da Educação, s./d.
O texto que vocês acompanham desde o domingo passado (2 jan. 2011) e que se estenderá pelas próximas semanas está relacionado à natureza dos conteúdos e, principalmente, às formas de distribuição (progressão) dos conteúdos de História em planos de aula, de unidade, ano, série, nível de ensino e, principalmente, nos currículos para a escolarização básica.
Os escritos foram divididos em cinco partes que tratam, respectivamente, de 1) definições de conteúdos históricos a partir dos currículos de História de alguns países da América, Europa e Oceania; 2) justificativas para o estudo da progressão no ensino de História e explicações e sugestões dos teóricos do desenvolvimento humano – Jean Piaget; 3) explicações e sugestões dos teóricos do desenvolvimento humano – Lev Semenovich Vigotsky; 4) explicações e sugestões de historiadores e pesquisadores do ensino de História para a progressão dos conteúdos históricos; e, 5) exemplos de progressão dos conteúdos históricos em alguns países da América, Europa e Oceania.
Na postagem de hoje, apresento algumas justificativas para o estudo da progressão no ensino de História, listo questões e teses fundamentais produzidas pelos teóricos do desenvolvimento nos últimos 100 anos, e anuncio potenciais usos da relação desenvolvimento/aprendizagem/progressão a partir da obra de Jean Piaget.

Por que estudar a progressão dos conteúdos históricos?
Conhecidos alguns sentidos para a palavra conteúdo e a definição operacional elaborada para este trabalho, indaguemos sobre a razoabilidade de se estudar a distribuição e a progressão dos conteúdos históricos.
É comum ministrar a mesma aula de História em turmas do segundo e do quinto ano ou, ainda, do sexto e do oitavo ano do Ensino Fundamental? Por que alguns professores universitários mantêm intactos seus planos de ensino, por anos a fio, independentemente de a disciplina estar situada no primeiro ou no oitavo período da licenciatura? O que diferencia o aluno do ensino superior do aluno do ensino fundamental?
Responder a essas perguntas é fácil. Todos dizemos que não se pode “dar” a mesma aula para alunos em distintos “estágios de desenvolvimento.” A escolarização básica é compreensivamente estruturada em “séries” ou “ciclos”, e essa disposição é tão óbvia que não questionamos a origem e a função de tais termos.
No ensino superior, ao contrário, é possível aplicar o mesmo plano em qualquer ano da graduação porque supomos que todos os alunos já estão “crescidos” e “maduros”. O próprio qualificativo – “superior” – é, muitas vezes, entendido como “fase” final de uma formação escolar exigida pela sociedade, que parte de estudos gerais sobre a vida e se finda com a especialização profissional em determinado campo, adquirida em universidades, institutos de pesquisa, centros de estudo ou faculdades.
Desenho de escola por um aluno de 11 anos.
Ausência de perspectiva, indiferença
nas dimensões dos personagens em
primeiro e em segundo plano.
Características de “realismo intelectual”
(estágio anterior aos 8 anos de idade).
Kevin Chagas Bacchus. Boa Vista, 2008.
Até aí, a maioria concorda: as aulas devem respeitar, entre tantas outras variáveis, as “idades” e as “dimensões” cognitiva, física e afetiva dos alunos. O problema começa quando nós professores somos chamados a anunciar e a justificar os critérios empregados na “sequência” e na “dosagem” dos conhecimentos e habilidades adquiríveis entre a primeira e a última série do ensino fundamental, por exemplo.
Tente argumentar sobre a sua prática: como você legitima a distribuição de conteúdos e carga horária no seu planejamento anual? É provável que lance mão de preceitos disseminados há, no mínimo, 500 anos, tais como: partir “do simples para o complexo”, “do próximo para o distante”, “do conhecido para o desconhecido”.
Visando, ainda, explicitar os fundamentos da sincronia entre os conteúdos e “etapas” às quais pertençam os seus alunos, é possível que você empregue procedimentos estatísticos: estabelecer padrões inicial (mínimo) e final (médio) e distribuir os conceitos e atividades, em “progressão aritmética crescente”, entre esses dois limites capitais.
Qual desses parâmetros respeita os avanços das pesquisas educacional e historiográfica? Qual deles nos fornece garantias de que a distribuição adotada viabiliza ou, pelo menos, não apresenta maiores empecilhos à aprendizagem histórica? O que significaria partir do simples e chegar ao complexo, em História? Qual é o padrão inicial e o padrão final em termos de conhecimentos e habilidades históricas? “Quanto” de informação o aluno pode e/ou deve manipular ao longo dos 9 anos do ensino fundamental?
Esse tipo de resposta nós encontraremos, inicialmente, nas teorias do desenvolvimento. Mas, é preciso estar consciente de que a pesquisa científica não oferece “a” resposta para essas questões. Isso ocorre, em primeiro lugar, porque uma das (descobertas e, por conseguinte, das) posições mais sensatas, assumidas por alguns estudiosos nas últimas duas décadas, tem sido o “ecletismo teórico”, ou seja, a ideia de que “diferentes teorias enfatizam diferentes aspectos do desenvolvimento, e o conhecimento de diversas teorias é necessário para explicar o curso e as complexidades do desenvolvimento humano”. (Shaffer, 2005, p. xx). O pensamento contrário, ou seja, a escolha de uma teoria educacional como orientadora de todas as tarefas escolares (Cf. Salvador, 2000, p. 211, 355) só costuma acontecer em contextos de fundamentalismo (religioso, político ou científico, entre outros).
Além dessa limitação humana – de não se poder estudar tudo sobre todos os aspectos e ao mesmo tempo –, as explicações sobre as diferenças intra/inter pessoais, sociais, culturais e, particularmente, entre criança e adulto, pessoa em formação e pessoa madura são elaboradas por filósofos, antropólogos, sociólogos, historiadores, psicólogos, biólogos, neurocientistas, entre outros tantos profissionais, cada um a seu tempo e modo e segundo particulares orientações epistemológicos e condicionantes ecológicos. Em outras palavras, as versões razoáveis sobre diferenças desenvolvimentais, que estão ao nosso alcance, são devedoras de variadas concepções de ciência e de homem.
A própria riqueza do nosso glossário escolar – crescer, modificar, formar, amadurecer, desenvolver, graduar, progredir, série, ciclo, grau, nível, básico, fundamental, médio, superior, fase, etapa, estado, estágio, período etc. – já é indício da variedade de campos do saber e de teorias que tentam responder, por exemplo, porque não se deve ensinar história local a uma adolescente de 11 anos, que passa horas à frente do computador operando um site de relacionamento virtual, da mesma forma que a uma mulher nascida ao final da Primeira Guerra Mundial, formada e ainda ambientada no mundo da cultura oral.
Em síntese, devemos, sim, estudar a distribuição sucessiva dos conhecimentos e habilidades históricas – aqui chamada de progressão –, e à luz de procedimentos extraídos de investigações rigorosas, sistemáticas e controladas. Essa atitude está fundada na consciência de que processo de escolarização básica significa também um processo de maturação do corpo discente em seus aspectos físico, cognitivo e afetivo.
Mas, como fazer valer a orientação de que o processo de maturação exige da escola conhecimentos e habilidades históricas adequadas aos diferentes momentos da experiência, às suas rupturas e/ou continuidades? Como planejar a progressão de forma a menos arbitrária possível, distanciando-se (e avançando para além) daquela máxima que se encerra em si mesma, citada no início deste texto: “é claro que não se pode dar a mesma aula. Afinal, os alunos encontram-se em diferentes estágios de desenvolvimento”?
Vamos conhecer um pouco desse intrincado jogo de justificativas e critérios de distribuição dos conteúdos históricos, pondo os olhos, inicialmente, nas teorias do desenvolvimento e da aprendizagem de (e baseadas em) autores legitimados pela tradição pedagógica brasileira, tais como Jean Piaget e Lev Semenovich Vigotsky.

Perspectivas desenvolvimentais, teorias da aprendizagem e possibilidades de progressão na obra de Jean Piaget
Desenvolvimentista é o nome dado ao estudioso das “continuidades sistemáticas e mudanças do indivíduo que ocorrem deste a concepção...até a morte” (Shaffer, 2005, p. 2), em outras palavras, desenvolvimentista é o especialista nos processos de desenvolvimento humano.
Aqui, os desenvolvimentistas são chamados à cena, sobretudo, por causa da relação necessária entre as ideias de homem e as de currículo. Se os currículos (com todas as orientações em termos de conteúdos, concepções de ensino, aprendizagem e estratégias de avaliação) são instrumentos de formação de pessoas, se são “documentos de identidade” (Cf. Silva, 2003), é compreensível que os seus criadores partam de determinada noção de homem, que considerem a condição ativa ou passiva desse homem, como também o caráter contínuo ou descontínuo do seu desenvolvimento (processo de maturação).
Essas divergências, como anunciado na postagem anterior, tem originando diferentes teorias, não apenas do desenvolvimento, mas também da educação e da aprendizagem escolar. É esse tipo de variação, em forma de modelos, questões e teorias do desenvolvimento e da aprendizagem, que o quadro n. 1 apresenta.

Quadro n. 1
Modelos e teorias do desenvolvimento
Questões/Modelos
Mecanicista
Organísmica
Contextual
O que é o homem?
Máquina – um conjunto de partes (peças) que podem ser decompostas.
Indivíduo completo – oposto à soma de partes.
Sujeito ativo que interage com o ambiente.
O homem é
ativo ou passivo?
Passivo – homens mudam apenas com a influência externa.
Ativo – homens mudam em resposta a forças internas (como instinto e maturação).
Ativa – homens agem, mas o ambiente também interfere no seu desenvolvimento.
O que é o desenvolvimento?
Processo que ocorre de forma gradual ou continua, à medida que as partes (padrões de comportamento) são acrescentadas ou retiradas.
Processo que ocorre por estágios diferentes (descontínuos) conforme os [homens] amadurecem.
Relação dinâmica entre o indivíduo e o ambiente. Possui aspectos peculiares a certas culturas, tempos ou indivíduos. Pode ser um processo  contínuo ou descontínuo.
Quais as teorias e os autores mais representativos ?
Behaviorismo (Watson), Aprendizagem operante (Skinner), Sócio-cognitiva/Aprendizagem observacional (Bandurra).
Psicanalítica (Freud, Erickson), Cognitivo-desenvolvimental (Piaget), Etológica ou evolucionista (Gessell, Bowlby, Gottlieb).
Sócio-cultural (Vigotsky), Processamento da informação (Siegler, Crowley, Munakata), Sistemas ecológicos (Bronfenbrenner).
Construído a partir do texto “Teorias do desenvolvimento humano”. Schafer, 2005, p. 35-67.

O quadro n. 1, como vemos, apresenta várias noções de natureza humana, desenvolvimento humano e também as teorias e os autores que podem ser classificados como desenvolvimentistas. É possível, portanto, que o Behaviorismo, Aprendizagem operante, Sócio-cognitivismo, Psicanálise, Cognitivismo desenvolvimental, Evolucionismo, Sócio-interacionismo, Processamento da informação e Sistemas ecológicos orientem a elaboração de currículos e, consequentemente, a distribuição de conteúdos pelo professor.
Todas se ocupam, de alguma forma, com os aspectos físicos, cognitivos, afetivos (individuais e sociais), fornecendo critérios para o planejamento da educação escolar. Mas, na impossibilidade de extrair de cada uma delas as orientações sobre as relações entre desenvolvimento, aprendizagem e progressão dos conteúdos, selecionei duas teorias abonadas por vários países ocidentais, entre os quais o Brasil. Trata-se da teoria Cognitivo-desenvolvimental, fundada por Jean Piaget, e da teoria Sócio-cultural, de Lev Semenovich Vigotsky (objeto da próxima postagem).
Piaget, sabemos todos, não pautou as suas pesquisas por objetivos educacionais, apesar de ter discutido aprendizagem e aquisição do conhecimento. Foi um epistemólogo (Salvador et. al, 2008, p. 248). Seus leitores autorizados também ponderam sobre as possibilidades de transferência das suas teses para a educação escolar (Cf. Davis, 2005, p. 49).
No entanto, o psicólogo publicou alguns trabalhos em final de carreira com preocupações especificamente pedagógicas, tais como o respeito às diferenças individuais, a necessidade de apresentar atividades desafiantes ao aluno e a aprendizagem por descoberta (Cf. Shaffer, 2005, p. 239).
Além disso, legitimou o emprego escolar dos resultados das suas pesquisas quando, por exemplo, denunciou o, digamos, despreparo dos profissionais da educação em relação ao conhecimento do desenvolvimento mental dos alunos:
É surpreendente como todos estão convencidos de que para ensinar matemática há necessidade de conhecê-la, sem ter de preocupar-se em como as noções se constroem efetivamente no pensamento da criança. Certamente deve-se ser concreto, “intuitivo”, etc. e, sempre que for preciso, inspirar-se na história das matemáticas, como se o desenvolvimento dos descobrimentos, desde Euclides até hoje, fosse paralelo às etapas da construção psicológica real das operações. Porém, ninguém se preocupa com essa construção psicológica por si mesma (Piaget, 1972, 1974, p. 47-48, apud. Salvador et al, 2000, p. 253).
Sem exagero algum, podemos substituir, na citação acima, o termo Matemática por História e o período corresponderá à realidade de muitas instituições brasileiras de ensino escolar e universitário. Trata-se da centenária ideia, inicialmente vinculada ao professor do ensino secundário, de que o bom profissional é aquele que tem a capacidade ampliada de reter e de expor a historiografia sobre pré-história, antiguidade, medievo, Brasil colonial, e assim por diante.
Se queremos experimentar o contrário, então, não custa observar o quadro n. 2 que apresenta elementos para se pensar a progressão dos conteúdos. Por ele, conhecemos as ideias de desenvolvimento, seus determinantes, as formas pelas quais o conhecimento da realidade é adquirido (ou a realidade é construída), os modos de pensamento e de ação e, por fim, o conjunto de funções/habilidades características de cada um desses esquemas.[1]

Quadro n. 2
Desenvolvimento e habilidades envolvidas na aquisição do
conhecimento em Jean Piaget
Questões
Proposições
Como ocorre o desenvolvimento?
Desenvolvimento da criança significa desenvolvimento mental. Ele resulta da sucessão de três modos de pensamento e ação (esquemas): sensório-motores (0a 2 anos), simbólicos (2 a 7 anos)  e operacionais (concreto – 7 a 11 anos, e formal – 11 ou 12 anos em diante).
Quais os determinantes do desenvolvimento?
A “maturação dos sistemas nervoso e endócrino” (dimensão física/orgânica/biológica), “o exercício e a experiência adquirida na ação efetuada sobre os objetos” (dimensão cognitiva), as “interações e transmissões sociais” (dimensão afetiva).
Como o conhecimento é adquirido?
A “incorporação do universo a si próprio” (compreensão e explicação do real pelo homem) é um processo (contínuo) de equilibração. Contempla o surgimento de uma necessidade (desequilíbrio) que mobiliza o sujeito (criança ou adulto) a agir (interesse) para satisfazer tal necessidade (equilíbrio). É uma “sequência de compensações ativas do sujeito em resposta às perturbações exteriores.”
Que funções / habilidades estão envolvidas no pensar e na aquisição do conhecimento?*
No Estágio pré-operacional ou esquemas simbólicos: imitação diferida, jogo simbólico (de ficção), desenho (imagem gráfica), imagem mental, e evocação verbal (de acontecimentos não atuais), lembrança-imagem (memória), e linguagem.
No Estágio das operações concretas (raciocínio a partir do agrupamento de objetos): seriação, classificação, aquisição das ideias de número (inteiro), de medidas de espaço, tempo, velocidade, e idéias de causa e acaso.
No Estágio das operações formais (raciocínio a partir do agrupamento de hipóteses): combinatória (combinação de idéias ou hipóteses por implicação, disjunção, exclusão, incompatibilidade e implicação recíproca, e inferência a partir dessas hipóteses), proporções (espaciais, velocidades métricas, equilíbrio), sistemas duplos de referência (reciprocidade), e probabilidades (assimilação de acaso).
Quadro construído a partir da leitura de Piaget e Inhelder (1990) e Piaget (1972).
(*) Neste quadro, transpus apenas os esquemas piageteanos relacionados à escolaridade conhecida no Brasil como Ensino Fundamental e Ensino Médio.
A leitura do quadro n. 2 pode nos auxiliar a entender a razão das censuras de Piaget aos profissionais da educação.  Mas, devem também explicar a exortação do psicólogo César Coll Salvador:
Graças a Piaget, temos um modelo de funcionamento individual e uma explicação dos mecanismos gerais por meio dos quais os alunos podem adquirir novos conhecimentos. E isso é essencial quando devemos delinear programas, elaborar tarefas, organizar atividades na aula e entender as dificuldades que os alunos apresentam de acordo com as suas capacidades cognitivas. Também é essencial quando necessitamos planejar situações educativas que potencializem o papel intuitivo e criativo dos alunos e que se distanciem de modelos de transmissão passiva da informação (Salvador et. all, 2000, p. 256, grifos meus).
Mas, em que medida Piaget pode orientar a progressão dos conteúdos históricos? O quadro n. 2 relaciona as funções nascidas/transformadas em cada um dos estágios referidos. Se aprofundássemos a descrição (aconselho a leitura dos textos originais), perceberíamos progressão em várias situações que auxiliariam nas tomadas de decisões de seleção e distribuição sucessiva dos conteúdos históricos.
De início, temos progressão no processo de aquisição do conhecimento (equilibração/desequilibração/assimilação/acomodação/equilibração) – acontecimentos que podem durar segundos, minutos, enfim, o tempo de uma hora-aula.
A progressão também pode ser vista no desenvolvimento da estrutura mental do aluno (sensóriomotor, simbólico e operacional) – processo que pode durar 12 anos ou mais, ou seja, que atravessa todos os anos da escolarização básica em vários países do Ocidente.
Da mesma forma, a sucessão de mudanças é observada no desenvolvimento de uma função/habilidade fundamental, como a representação (imitação, jogo simbólico, desenho, imagem mental e evocação verbal).
Por fim, a progressão está presente no desenvolvimento de um conjunto de condutas constituintes de uma função – a exemplo da função/habilidade de desenhar, que passa por várias fases de realismo (fortuito, gorado, intelectual e visual).
Ao final desta série de postagens demonstrarei que algumas das possibilidades de progressão sugeridas pela teoria do desenvolvimento de Piaget já fazem parte da agenda dos pesquisadores do ensino de História, ainda que estes não estejam, especificamente, preocupados com o problema da progressão dos conteúdos históricos.

Objeto, espaço, causa e tempo
Prefaciando a Construção do real na criança, de Jean Piaget (1996), Yves de La Taille resume o esquema do livro e, indiretamente, nos informa sobre possibilidades de progressão no planejamento do ensino de História.
Tomemos o exemplo da noção de objeto permanente, ou conservação do objeto, aspecto central da construção do real. Ela diz evidentemente respeito à construção da noção de objeto, considerado como existindo de maneira independente de ser percebido. Refere-se também ao espaço, uma vez que quem diz “objeto” também diz que este ocupa determinado lugar no universo. Portanto, a permanência desse objeto acompanha uma estruturação do espaço: por exemplo, os objetos podem estar uns atrás dos outros, fato que explica tornarem-se momentaneamente invisíveis. Quanto à causalidade, a construção da noção de objeto permanente implica a relativização do poder da ação própria: a existência e o lugar dos objetos independem (ou podem independer) dela. A esse objeto, a quem reconhece a independência no que tange sua existência, a criança vai também começar a atribuir causalidade própria, no sentido de ser possível causa de transformações no universo (isso fica particularmente claro em relação aos objetos-pessoa, que passam a ser vistos como fontes autônomas de ação). Finalmente, a noção de campo temporal também evolui: a criança, que antes limitava-se a lembrar a sequência de suas ações, passa agora a rememorar a sequência dos eventos exteriores. De fato, a noção de objeto permanente implica que a criança lembre do quadro anterior a seu desaparecimento no campo da sua percepção e o situe em relação ao que vê. (La Taille, 2006, p. 9-10).


















Próxima postagem
Explicações e sugestões dos teóricos do desenvolvimento humano para a progressão dos conteúdos históricos: a experiência de Lev Semenovich Vigotsky.


Fontes das imagens
Detalhe da capa de Caderno do aluno – 2º 3º ano do Ensino Médio. Porto Alegre: Secretaria Estadual e Educação. s./d.
Desenho de escola por um aluno de 11 anos.  Ausência de perspectiva, indiferença nas dimensões dos personagens em primeiro e em segundo plano. Características de “realismo intelectual” (estágio anterior aos 8 anos de idade). Kevin Chagas Bacchus. Boa Vista, 2008. BOA VISTA. PREFEITURA MUNICIPAL. Proposta curricular municipal do ensino fundamental dos anos iniciais. Boa Vista: Secretaria Municipal de Educação, 2008.


Para citar este texto
FREITAS, Itamar. Conteúdos e progressão dos conteúdos no ensino de História (2): a contribuição dos teóricos do desenvolvimento (Jean Piaget).<http://itamarfo.blogspot.com/2011/01/conteudos-e-progressao-dos-conteudos-no_09.html>.


Referências
DAVIS, Claudia. Piaget ou Vygotsky, uma falsa questão. Viver – Mente&Cérebro. Rio de Janeiro, v. 2, p. 38-49, 2005. (Edição especial – Coleção Memória da Pedagogia, v. 2).
LA TAILLE, Yves. Prefácio. In: PIAGET, Jean. A construção do real na criança. 3 ed. São Paulo: Ática, 2006.
PIAGET, Jean. Os estádios de desenvolvimento intelectual da criança e do adolescente. In: LEITE, Dante Moreira. O desenvolvimento a criança: leituras básicas. São Paulo: Companhia Editora Nacional/Universidade de São Paulo, 1972. pp. 199-208.
PIAGET, Jean; INHELDER, Bärbel. A Psicologia da criança. 11 ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 1990.
SALVADOR, César Coll et. al. A teoria genética da aprendizagem. In: Psicologia do ensino. Porto Alegre: Artmed: 2000. pp. 249-257.
SALVADOR, César Coll et. al. Psicologia do ensino. Porto Alegre: Artmed: 2000.
SHAFFER, David R. Psicologia do desenvolvimento. São Paulo: Cangage Learnig, 2009.
SILVA, Tomaz Tadeu da. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. 2. ed. Belo Horizonte, Autêntica, 2003.


Notas
[1] É certo que o desenvolvimento é um empreendimento holístico: “somos, ao mesmo tempo, seres físicos, cognitivos, sociais e emocionais, e todas essas tendências desenvolvimentais estão interligadas como um todo na pessoa em desenvolvimento” (Shaffer, p. 619). Em decorrência dessa condição, sabemos que o desenvolvimento da dimensão afetiva interfere no cognitivo, que interfere na construção das identidades, que interfere no desenvolvimento psicomotor e assim por diante. Mas, os elementos eleitos nesse texto dizem respeito, sobretudo, à dimensão cognitiva, que maior atenção tem recebido na escola de massa contemporânea. O termo cognitivo, aqui, tem o sentido de adjetivo, relativo à aquisição e uso do conhecimento.

domingo, 2 de janeiro de 2011

Conteúdos e progressão dos conteúdos no ensino de História (1)

Detalhe da capa de: The australian curriculum. 2008.
As postagens que vocês acompanharão nesta e nas próximas semanas estão relacionadas à natureza dos conteúdos e, principalmente, às formas de distribuição (progressão) dos conteúdos de História em planos de aula, de unidade, ano, série, nível de ensino e, principalmente, nos currículos para a escolarização básica.
Os escritos foram divididos em cinco partes que tratam, respectivamente, de 1) definições de conteúdos históricos; 2) conteúdos históricos nos currículos de alguns países da América, Europa e Oceania; 3) justificativas para o estudo da progressão no ensino de História: explicações e sugestões do teóricos do desenvolvimento humano; 5) explicações e sugestões de historiadores e pesquisadores do ensino de História para a progressão dos conteúdos históricos; e, 6) exemplos de progressão dos conteúdos históricos em alguns países da América, Europa e Oceania.

Que são conteúdos históricos?
Conteúdo é assunto/teor (Luft, 2002; Ferreira, 2010). É o que está dentro, incluído, limitado, contido. Se pensarmos o ensino de História em termos disciplinares e transpusermos a definição abonada pelos dicionários de sinônimos brasileiros, daremos razão a André Chervel (1991) que define simploriamente “conteúdo” como tudo aquilo que se ensina, aquilo que está dentro, limitado pela História disciplina escolar. Mas, o que pode ser considerado conteúdo histórico? O que pode migrar para dentro da disciplina História? Como, enfim, selecionar conteúdos?
Para responder à primeira questão, sobre a natureza do histórico, evoco definições empregadas na postagem anterior – O que são conceitos históricos? Naquele texto, afirmei que os historiadores divergem bastante sobre o adjetivo. Histórico pode ser uma palavra que nomeia artefatos, seres ou fenômenos datados tópica e cronologicamente, por exigência metodológica – a exemplos de “Reforma” e “Renascimento” (Cf. Besselaar, 1973). Mas é também uma função que tem determinada palavra de atribuir significado (interpretar), reunindo/relacionando “lembrança do passado” e expectativa do futuro”, a exemplo de “experiência” e “progresso” (Cf. Rüsen, 2007, Koselleck, 2006).
Dentro da mesma orientação, afirmo que as indagações referentes aos critérios de admissibilidade de determinados acontecimentos e sujeitos como conteúdo da disciplina escolar podem ser respondidas com o incômodo vocábulo “depende” – depende das finalidades atribuídas à disciplina que, por sua vez, depende do perfil humano que se quer cultivar. A seleção de conceitos em História, assim como a escolha da dimensão humana a ser explorada e dos objetos de pesquisa privilegiados pelos historiadores, é uma atividade claramente política.
Inicialmente, a escolha sobre “o que” ensinar é (ao menos, deveria ser) balizada por mais perguntas: que conteúdos são condizentes com o sujeito e a sociedade que quero construir? Que aspectos da vida devem ser privilegiados no trabalho de seleção dos conhecimentos que interferem no desenvolvimento – o psicomotor, cognitivo, afetivo (pessoal e social)? O que os alunos devem conhecer? Devemos cuidar, primordialmente, da proteção ao meio ambiente, da apreciação estética, do desenvolvimento do raciocínio lógico, do gênio inventivo da ciência e da tecnologia, da convivência com os diferentes ou da Democracia? (Cf. Freitas, 2010).
Livros - Marco para la buena enseñanza. C y C Impresores, 2008.
Ao longo do século XX, várias foram as respostas fornecidas em culturas as mais diversas. Aqui, exemplifico apenas três sentidos produzidos por norte-americanos e ingleses e encerro com algumas posições correntes entre os professores e os pesquisadores do ensino de História no Brasil.
No programa de Estudos Sociais das escolas Dalton, uma das chamadas escolas renovadas de Nova York, em meados da década de 1940, os conteúdos seriam constituídos por elementos relativos à natureza humana individual (necessidade, sobrevivência, segurança, liberdade e ideal), ao ambiente físico (espaço, tempo, ambiente, clima e recursos naturais) e ao ambiente social (organização social, Cidade-Estado, revolução, capitalismo e nacionalismo). (Cf. Tyler, 1977, p. 82-85).
Na segunda metade do século XX, ainda nos Estados Unidos, planejadores educacionais pensaram a vida no mundo – a experiência em sociedade – como constituída por coisas, lugares e fatos, valores e métodos de ciência. Os conceitos fundamentais ao currículo escolar, inclusive os de Estudos Sociais, seriam, portanto, os objetos ou atos de pensamentos que nomeiam coisas, lugares, acontecimentos, valores e estratégias controladas de produção da verdade.
Na década de 1970, uma classificação bem mais simples privilegiou os constituintes da aprendizagem (em sua versão cognitivista) e dividiu o que se deveria conhecer na escola em duas dimensões: os conhecimentos objetivos (substantivos) e as habilidades (verbos). Inspirados nessa abordagem, talvez, alguns teóricos do ensino de História, na Inglaterra, passaram a sugerir uma classificação também bipartida. Conteúdos históricos, então, seriam: 1) termos que nomeiam seres, lugares, ações humanas (fenômenos, fatos) e 2) termos que nomeiam conceitos e/ou atividades que remetem às habilidades essenciais à compreensão crítica de conceitos, proposições e narrativas históricas (Cf. Lee, 2005).
Essa última classificação já é citada nos trabalhos dos pesquisadores brasileiros do ensino de História. Entre os professores, porém, reina a ideia difundida nos Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN, fundados nas orientações da Unesco, de que os conteúdos são do tipo conceitual, atitudinal e valores, que correspondem à topologia expressa no Relatório Jaques De Lors – saber (fatos, princípios), saber-fazer (procedimentos), e saber ser/estar consigo mesmo e socialmente (valores, normas e atitudes). (Brasil, 1997, p. 47).
Chegamos, assim, ao fim do circuito inicial para discutir a progressão dos conteúdos históricos. Sugiro reter, então, a ideia inicial de conteúdo como tudo aquilo que se ensina, circunscrito à disciplina escolar História. A natureza da adjetivação – “histórico” – e os critérios de eleição como elementos da disciplina escolar, entretanto, variam conforme as concepções de ciência da História e, sobretudo, da ideia de desenvolvimento humano.
São esses abonamentos – das teorias do desenvolvimento e da história – que discutiremos nas próximas postagens. Antes, porém, apresentarei alguns exemplos de conteúdos históricos destinados à escolarização básica em nove países situados em quatro continentes do globo.

Conteúdos históricos em currículos da Austrália, Brasil (Minas Gerais), Canadá (Ontário), Estados Unidos (Sout Carolina), Inglaterra, México, Nova Zelândia, Portugal e Suíça: em busca de uma definição instrumental
Afirmei acima que os conteúdos são debitários das finalidades da disciplina e das ideias de desenvolvimento humano. Deixando os aspectos desenvolvimentais para a próxima postagem, vejamos agora como alguns países de quatro continentes definem conteúdos, se o conjunto da minha aleatória amostra fornece indícios de alguma tendência.[1]
Quadro n. 1
Finalidades e conteúdos nos currículos de História na Austrália, Brasil, Canadá, Estados Unidos
Inglaterra, México, Nova Zelândia, Portugal, e Suíça

Países
Nome
Finalidades
Conteúdos
Austrália
(2010)
5/8-15/18 anos
History
To understanding ourselves and others…promotes the understanding of societies, events, movements and developments that have shaped humanity from earliest times… appreciate how the world and its people have changed, as well as the significant continuities that exist to the present day. (p. 1).
Historical Knowledge and understanding and Historical Skill (p. 1).
Brasil
M. Gerais
s.d [2003]
11-14 anos
História
Desenvolvimento de habilidades e atitudes necessárias ao exercício de uma cidadania participativa, crítica e comprometida com os valores democráticos [e do] raciocínio histórico (p. 3).
Habilidades e conteúdos/conceitos e conteúdos/habilidades e atitudes (p. 1, 3).
Canadá
Ontário
(2006)
[7-14 anos]
Social studies/
History/
Geography1
Informed citizens in a culturally diverse and interdependent world and to participate and compete in a global economy (p. 2).
The study of history helps prepare students to be contributing and responsible citizens in a complex society characterized by rapid technological, economic, political, and social change (p. 3).
knowledge and skills (p. 10-11).
EUA
S. Carolina
[7-14 anos]
(2005)
Social studies
A working knowledge of government, geography, economics, and history is essential for effective citizenship in a democracy, the theme for these standards is civic education (p. 1).
Knowledge and skills (p. 3, 106).
Inglaterra
(1999)
 7-14 anos
History
Promoting pupils’ spiritual, moral, social and cultural; citizenship.
Knowledge, skills and Understanding
México
(2008)
Secundário
Historia
Permiten al alumno avanzar en el desarrollo de las nociones de espacio y tiempo históricos, ejercitarse en la búsqueda de información com sentido crítico, y refl exionar sobre los sucesos y procesos del pasado que han conformado lãs sociedades actuales (p. 7).
Conceptos, procedimientos actitudes y valores(p. 9, 27).
Nova Zelândia
(2007)
[6-14 anos]
Social sciences/ History, Geography, Economy
Learning area is about how societies work and how people can participate as critical, active, informed, and responsible citizens. Contexts are drawn from the past, present, and future and from places within and beyond New Zealand (p. 17, 30).
Values, kay competencies, Learning areas (p. 30).
Portugal
[2006]
[6-14 anos]
Estudo do meio/
História/
Geografia, e História2
Desenvolver o conjunto de competências consideradas essenciais no âmbito do currículo nacional..., necessárias à qualidade da vida pessoal e social de todos os cidadãos.

Competências específicas e gerais
Temas
Suíça
(2001)
[12-14 anos]
Histoire et education citoyenne
Développer et favoriser l’acquisition de sept compétences qui sont à promouvoir autant que possible auprès de tous les élèves, et constituent ce regard spécifique sur le monde qui est propre à l'histoire et aux historien (p. 22).
Objectifs d’apprentissage [compétences] (p. 23-24).
Obs.: 1 Social studies [grades 1 to 6], History and Geography [7 and 8]; 2 - Estudo do Meio (1.º ciclo), História e Geografia de Portugal (2.º ciclo) e História (3.º ciclo).

Evidentemente, os currículos definem conteúdo por exemplificação, já que não são peças teóricas, e sim projetos, cartas de intenções, programas, documentos normativos etc. Mas, é possível identificar alguns dos seus constituintes e efetuar cruzamentos, sobretudo, entre as finalidades anunciadas e a tipologia esboçada na apresentação dos conteúdos.
A primeira constatação que salta aos olhos é a de que o ensino disciplinarizado de História não é universal (como pensamos, na maioria das vezes em que defendemos a manutenção e/ou ampliação do seu espaço). O conhecimento ou a recuperação da experiência dos homens no tempo está presente nos exemplares analisados. Mas, ele pode vir acompanhado da Geografia e dos estudos de cidadania ou, ainda, inserido nos Social studies e no Estudo do meio.
A variedade dos desenhos curriculares implica a sua distribuição e posição no tempo reservado à escolarização básica. Pode situar-se no ensino das crianças, apenas no ensino dos adolescentes, no ensino das crianças e dos adolescentes, ou apenas em dois anos do ensino dos adolescentes. Mas, o que dizer das suas finalidades?
Lápis de cor. Marco para la buena enseñanza. C y C Impresores, 2008. 
Aqui também a diversidade é a tônica. Compreender, desenvolver, informar, efetivar, promover, viabilizar a participação e facilitar a aquisição são os verbos destacados nas finalidades. A ação – a construção, aquisição ou o desenvolvimento de habilidades/capacidades – concretiza-se sobre substantivos bastante conhecidos no Brasil: compreender a sociedade em mudança, a mudança, as diferenças culturais, prezar pela qualidade de vida, pelos valores democráticos e, o mais citado, formar o cidadão – que se desdobra na construção da cidadania e seus respectivos e, às vezes, redundantes qualificativos: informada, crítica, ativa, responsável e participativa.[2]
Finalmente, os conteúdos. Que dizem os planos? A variação de termos que indicam tipos é menor que nos indicadores já comentados. Traduzindo skill por habilidades (sem falar na possibilidade de traduzi-la, também, por competência) e Knowledge (e também subjects, tema, sub-tema, conceptos-chave) por conhecimento (conteúdo conceitual), teremos o par knowledge/skill como tipologia dominante. O tipo de menor incidência é o que inclui a tríade valores, procedimentos/atitudes e conceitos. Juntamente com a opção “competências específicas e gerais”, a tríade faz referência direta à integração conteúdos gerais para a escolarização básica/conteúdos específicos relativos ao ensino de História.
Com isso, não quero dizer que os outros não a façam. Apenas menciono o destaque oferecido à tipologia. As traduções skill/habilidades e knowdledge/conhecimento-conteúdo conceitual também podem apresentar algumas variações. Por isso, descrevemo-las ao nível do exemplo para responder com maior propriedade o que seriam conteúdos históricos configurados no par knowdledge/skill – a partir, repito, das propostas em análise.

Quadro n. 2
Conhecimentos e habilidades nos currículos de História na Austrália, Brasil,
Canadá, Estados Unidos Inglaterra, México, Nova Zelândia, Portugal, e Suíça

Países
Knowdledge
Skill
Austrália
(2010)

5/8-15/18 anos
Historical Knowledge and understanding - personal, family, local, state or territory, national, regional and world history. Societies, events, movements and developments. Key concepts for developing historical understanding (evidence, continuity and change, cause and effect, significance, perspectives, empathy and contestability) (p. 1).
Historical Skill - historical inquiry: chronology, terms and concepts; historical questions and research; the analysis and use of sources; perspectives and interpretations; explanation and communication (p. 1).
Nova Zelândia*
(2007)

[6-14 anos]


Learning areas1 Continuity and Change2 (past events, experiences, and actions and the changing ways in which these have been interpreted over time. This helps them to understand the past and the present and to imagine possible futures) (p. 30).3
Kay competencies (thinking, using language, symbols, and texts, managing self, relating to others, participating and contributing).
Inglaterra
***
(1999)

 7-14 anos
Knowledge, skills and Understanding in the programmes of study identify the aspects of history in which pupils make progress:chronological understanding, knowledge and understanding of events, people and changes in the past, historical interpretation, historical enquiry, organisation and communication. These aspects of history are developed through teaching the content relating to local, national, European and world history (p. 6). [Exemplo:] British history - In their study of British history, pupils should be taught about:a) the Romans, Anglo-Saxons and Vikings; Britain and the wider world in Tudor times; and either Victorian Britain or Britain since 1930; b) aspects of the histories of England, Ireland, Scotland and Wales, whereappropriate, and about the history of Britain in its European and widerworld context, in these periods (p. 18).
Suíça
(2001)

[12-14 anos]
Secundário


Thèmes
7e – de la révolution néolithique à la formation de l’Europe médiévale; 8e – de la civilisation médiévale à la Révolution française (principes); 9e – le XIXe siècle et le XXe siècle (p. 3).
Objectifs d’apprentissage [compétences] être capable de critiquer dês sources, savoir interroger Le passé pour mieux comprendre le present, prendre en compte l’”autre”, être sensible à la complexité des temps et des durées, distinguer l’histoire et la mémoire, prendre em considération l’expression de h’histoire dans lês champs culturel et médiatique, acquérir progressivement dês points de repère et une culture generale (p. 23-24).

Portugal
[2006]

[6-14 anos]
Conteúdos/tematização
Ciclo 1 - Passado e espaço próximos: familiar e local/nacional (Conhecimento de si próprio, os outros e as instituições, o espaço físico e humano, mundo). Ciclo 2 - História e Geografia: Portugal no passado e no presente (A Península Ibérica: dos primeiros povos à formação de Portugal - século XII, do século XIII à União Ibérica e Restauração – a séc. XVII, do Portugal do século XVIII à consolidação da sociedade liberal, o século XX). Ciclo 3 (p. 25, 28, 30).
Competências (específicas1/gerais) - 1) tratamento de informação, utilização de fontes/Pesquisar, seleccionar e organizar informação para a transformar em conhecimento mobilizável; 2) compreensão histórica (temporalidade, espacialidade, contextualização)/Mobilizar saberes culturais, científicos e tecnológicos para compreender a realidade e para abordar situações e problemas do quotidiano; 3) comunicação em História/usar adequadamente linguagens das diferentes áreas do saber cultural, científico e tecnológico para se expressar. Usar correctamente a língua portuguesa para comunicar adequadamente e para estruturar o pensamento próprio.

México**
(2008)

Secundário
Conceptos-chave [Exemplo:] 2º grado - De principios del siglo XVI a principios del siglo XVIII: capitalismo, ciencia, conquista,
contrarreforma, hegemonía, humanismo,
mestizaje, reforma, renacimiento, resistencia. (p. 27). En los programas se consideraron...cuatro ámbitos de análisis: económico, social, político y cultural (p. 13).
Las competencias propias de esta asignatura son: Comprensión del tiempo y el espacio históricos: implica el análisis de la sociedad en El pasado y el presente desde una perspectiva temporal y espacial considerando el ordenamiento cronológico, la duración, el cambio y la permanencia, y la multicausalidad. Manejo de información histórica para desarrollar habilidades y un espíritu crítico que permita confrontar diversas interpretaciones; competencia para comunicar los resultados de una investigación y responder a interrogantes del mundo actual. Formación de una conciencia histórica para la convivencia democrática e intercultural (p. 9).
Canadá
Ontário
(2006)

[7-14 anos]
Subjects – Grades 1 to 6: Heritage and Citizenship, Canada and World Connections. Grade 7: New France, British North America, Conflict and Change. Grade 8: Confederation, The Development of Western Canada, Canada: a changing society (p. 8).

knowledge and skills categories
1) knowledge and Understanding. Subject-specific content acquired in each grade (knowledge), and the comprehension of its meaning and significance (understanding); 2) thinking - planning skills (focusing research, gathering information, organizing an inquiry), processing skills (analysing, evaluating, synthesizing), critical/creative thinking processes (inquiry, problem solving, decision making, research); 3) communication - oral (story, role play, song, debate), written (report, letter, diary), visual (model, map, chart, movement, video, computer graphics); 4) application. The use of knowledge and skills to make connections within and between various contexts (p. 10-11).
EUA
SC
[7-14 anos]
(2005)
Knowledge
Factual, conceptual, procedural, metacognitive knowledge (p. 106).
[Exemplo]
Grade 5 - United States Studies: 1865 to the Present. Standard 5-5 - The student will demonstrate an understanding of the social,economic, and political events that influenced the United States during the Cold War era. Indicators 5-5.1 – Summarize the impact of cultural developments in the United States following World War II, including the significance of pop culture and mass media and the population
shifts to the suburbs. (G, H)
Skills
Remember, understand, apply, analyze, evaluate, create (p. 3, 106).
Brasil
Minas Gerais
s.d [2003]
11-14 anos

Temas
Exemplo: Histórias de Vida, Diversidade Populacional (Étnica, Cultural, Regional e Social) e Migrações Locais, Regionais e Intercontinentais. Subtemas
Diversidade populacional e migrações em Minas Gerais e no Brasil (p. 8-9).
Habilidades
Exemplo: Conceituar migração e imigração; Identificar a diversidade populacional presente em sala de aula, na escola e na localidade do aluno, em termos sociais, étnicoculturais e de procedência regional; analisar e interpretar fontes que evidenciem essa diversidade; Analisar as festas étnico-culturais como manifestação de hibridismo: Congado, Carnaval, Maracatu, Bumba-meuboi, Reisado, Capoeira, festa de Iemanjá, Folia de Reis, entre outras (p. 9).
Obs: 1 – “As competências específicas foram definidas a partir do que se considera como os três grandes núcleos que estruturam esse saber, ou seja, oTratamento de Informação/Utilização de Fontes, Compreensão Histórica, esta consubstanciada nos diferentes vectores que a incorporam: a temporalidade, a espacialidade e a contextualização, e a Comunicação em História. (*) Outros tipos de conteúdo: Nova Zelândia - Values (excellence; innovation, inquiry,and curiosity; diversity; equity; community and participation; ecological sustainability; integrity) (p. 30).  (**) Outros tipos de conteúdo:  México - Se incluyen contenidos referentes a conceptos, procedimientos y actitudes...relativos a la conciencia histórica reflejada en el patrimonio cultural y la convivência intercultural (p. 9)...actitudes y valores que fomenten la convivencia democrática e intercultural en el aula y la escuela mediante la práctica cotidiana de valores de solidaridad, respeto, responsabilidad, diálogo y tolerância (p. 18). (***) Não há como isolar exemplos das três categorias, mantendo o sentido original do plano. Por isso, a célula correspondente aos conteúdos ingleses foi mesclada.

Analisando as informações apresentadas no Quadro n. 1 e detalhadas no Quadro n. 2, podemos constatar que a variação de nomes e de posições dentro do currículo – na amostra recolhida para este trabalho (repito) – não acarreta modificações significativas em termos de finalidades para o ensino de História. No desenho dos planos, não há perdas em termos de identidade da disciplina.
Quanto aos sentidos de conteúdo, é possível perceber que a divisão em dois tipos – knowdlege e skills (nos sentidos de conhecimento conceitual e habilidades) – sobressai-se diante das demais variantes. Com essas informações, arrisco-me a continuar empregando a locução “conteúdos históricos” como conjuntos de conhecimentos conceituais e de habilidades que devem ser adquiridas ou desenvolvidas no/pelo alunado de História no período da escolarização básica.
Os skills (manteremos esta terminologia até o final desta série de postagens) diferenciam-se conforme maior, ou menor, aproximação com as questões levantadas pelas teorias da História ou da aprendizagem. Mas, ainda que recebam os nomes de competência específica, competência geral, competência-chave, expectativa de aprendizagem ou, simplesmente, habilidades, os skills referem-se sempre a uma ação que deve ser (novamente os termos) adquirida ou desenvolvida pelo/no aluno, haja vista a necessidade e a sua imprescindibilidade para a sobrevivência coletiva.
Os knowdlege, da mesma forma, não obstante expressarem conceito, conceito-chave, conhecimento histórico, tema, subtema, área de aprendizagem etc., mantém o sentido de substância a ser consumida, reconhecida, recuperada, utilizada etc. São quase “entes”, configurados como sujeitos, acontecimentos, processos (sucessões de acontecimentos), datações tópicas, datações cronológicas, cenários que dão sentido à experiência humana quando dispostos em formato narrativo.
Skills e knowdlege são constituídos conforme maior, ou menor, aproximação das teorias da História e da aprendizagem, afirmei acima. Melhor seria dizer que ambos têm origem nas escolhas que os curriculum-makers efetuaram em termos de homem, vida, desenvolvimento e História. Isso nos obriga, então, a investigar sobre tais escolhas (não necessariamente dos exemplos aqui recolhidos). Skills e Knowdlege, veremos, são selecionados e distribuídos segundo critérios de progressão. O que fundamenta essas progressões? Posso adiantar que os historiadores raramente foram chamados para embasar tal procedimento. Os desenvolvimentistas têm mais espaço nessa tarefa. Na próxima postagem, vamos conhecer um pouco desse intrincado jogo de justificativas e critérios de distribuição dos conteúdos históricos, pondo os olhos nas teorias de autores bastante conhecidos, tais como Jean Piaget e Lev Semenovich Vigotsky.

Para citar este texto
FREITAS, Itamar. Conteúdos e progressão dos conteúdos no ensino de História (1). Nossa Senhora do Socorro: 2 jan. 2010.<http://itamarfo.blogspot.com/2011/01/conteudos-e-progressao-dos-conteudos-no.html>.

Fontes das imagens

Historical Knowledgeand understanding and Historical Skill. The australian curriculum. Learning areas History/Year levels Foundation Curriculum –Version 1.1. 13 dec. 2010.
Livros. Ministerio de Educación. Marco para la Buena Enseñanza. [Santiago]: Centro de Perfeccionamiento, Experimentación, 2008. p. 10. (Diseño: C y C Impresores Ltda).
Lápis de cor. Ministerio de Educación. Marco para la Buena Enseñanza. [Santiago]: Centro de Perfeccionamiento, Experimentación, 2008. p. 22. (Diseño: C y C Impresores Ltda).

Referências
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CHERVEL, André. História das disciplinas escolares: reflexões sobre um campo de pesquisa. Teoria & Educação, Porto Alegre, n. 2, pp. 177-229, 1990.
Departement de L’Instruction Publique. Cycle d’orientation de l’enseignement secondaire: Plan d’etudes. Histoire et Education citoyenne. Genéve, 2001.
Department for Education and Employment. The National Curriculum for England. London, 1999. Disponível em:<www.nc.uk.net>.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo Dicionário da Língua Portuguesa. 2. ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986.
FREITAS, Itamar. Fundamentos teórico-metodológicos para o ensino de História (Anos iniciais). São Cristóvão: Editora da UFS, 2010.
LEE, Peter. Caminhar para trás em direção ao amanhã: a consciência histórica e o entender a história. Disponível em www.cshc.ubs.ca/viewabstract.php. Acesso em 21 nov. 2005.
LUFT, Celso Pedro. Minidicionário Luft. São Paulo: Ática, 2000.
Ministério da Educação. Currículo Nacional do Ensino Básico [de Portugal]: textos (História). Disponível em:<http://www.educacao.te.pt/professores/index.jsp?p=164>.
Ministry of Education. The New Zealand Curriculum. [Wellington]: Learning Media, 2007.
Ministry of Education. The Ontario Curriculum: Social Studies (Grades 1 to 6), History and Geography (Grades 7 and 8). 2004. Disponível em: <http://www.edu.gov.on.ca.>.
Secretaría de Educación Pública. Educación básica. Secundaria. Historia. Programas de estudio 2006  2 ed. México, 2008.
SILVA, Tomaz Tadeu Da. Documentos de identidade: uma introdução às teorias do currículo. 2. ed. Belo Horizonte, Autêntica, 2003.
TENENBAUM, Inez Moore. South Carolina Social Studies Aademic Standards. South Carolina: Department of Education, 2005.
The australian curriculum. Learning areas History/Year levels Foundation Curriculum –Version 1.1. 13 dec. 2010.
TYLER, Ralph Winfred. Princípios básicos de currículo e ensino. Porto Alegre: Globo, 1997. [Primeira edição em inglês – 1948].

Notas
[1] Não vou fazer descrição exaustiva dos currículos, nem explicar as motivações para a escolha dos conteúdos. Também não tecerei considerações sobre o sistema educacional de cada país. Este espaço (a postagem), o gênero (nota de pesquisa) e o meu interesse não permitem. Minha intenção, lembrando o tópico anterior, é levantar exemplos que permitam construir uma noção operatória para a expressão conteúdos históricos, possibilitando, assim, a discussão sobre a progressão dos conteúdos no ensino de História. Com base nesses objetivos, selecionei currículos de tradições historiográficas e pedagógicas semelhantes e diferentes aos do Brasil, de regimes educacionais centralizados e descentralizados, de ensino de História disciplinarizado e não disciplinarizado, do ensino de crianças e de adolescentes em países de continentes diferentes.
[2] Embora não apareça na transcrição deste quadro, “formar a consciência histórica” está explicitamente declarado no currículo do México, mas como eixo estruturante do programa de História (p. 13).