domingo, 1 de junho de 2003

Usos e abusos da "cultura escolar"

Por que a História é constantemente reescrita? Por duas simples razões: o seu objeto é temporal e os quadros humanos que a elaboram, bem como o aparato teórico-metodológico que a sustenta, estão sempre em mutação (Cf. Reis, 1999). Pensando dessa forma, pode-se compreender melhor o surgimento, a extinção e a reconfiguração de campos disciplinares e, nesse caso, em particular, as transformações ocorridas na historiografia da educação. Este trabalho examina a trajetória de uma possível mutação nas formas da escrita dos pesquisadores que se auto-identificam como historiadores da educação.[1] O texto analisa o emprego da expressão “cultura escolar” [2] em trabalhos aceitos pelo II Congresso da Sociedade Brasileira de História da Educação por entender que o conhecimento sobre os usos de uma determinada “categoria” podem muito informar sobre o modo de circulação das idéias entre países com tradições e possibilidades de trabalho bastante peculiares como a França e o Brasil, em matéria de História da Educação.
Num primeiro momento, este trabalho apresenta, sucintamente, os processos de reconfiguração do campo História da Educação na França e no Brasil. Em seguida, comenta as duas noções mais correntes em torno da expressão “cultura escolar” e examina os usos da expressão nos trabalhos apresentados sob o eixo temático “História de Culturas Escolares e Profissão Docente no Brasil” que reuniu a maior quantidade de textos aprovados no referido Congresso. Foram cento e onze, entre as quatrocentas e vinte e oito comunicações aceitas.


História da Educação: um pouco da reconfiguração dos campos francês e brasileiro
A memória sobre a historiografia da educação na França recolhe as conseqüências da sua inserção em campos mais amplos, como o da pesquisa sobre educação e os estudos produzidos sob a rubrica de História cultural. Com a literatura da qual dispomos, produzida pelo Institut Nacional de La Recherche Pédagogique - INRP e pela École Pratique des Hautes Études - EPHE, principalmente, a historiografia francesa sobre a educação, nas últimas três décadas, tem se constituído em, pelo menos, três orientações, dispostas em paralelo ou diacronicamente: a história (política) da evolução dos sistemas de ensino; a narrativa denuncista do reprodutivismo produzido pela escola; e a história que privilegia as práticas internas dessa mesma instituição.
No plano diacrônico, tanto Dominique Julia (1995)  como Antonio Viñao Frago (1996) indicam mudanças significativas nas três últimas décadas do século XX. No texto de Julia, a identificação das transformações nas problemáticas da pesquisa em educação oferecem nitidez a uma possível periodização.
Na década de 1970, o estudo sociológico das populações escolares, em diferentes níveis de escolaridade, assim como a análise do sucesso escolar desigual segundo as categorias sócio-profissionais, conduziram numerosos historiadores nas pegadas de Pierre Bourdieu e Jean-Claude Passeron (mas também na agitação dos acontecimentos de maio de 1968) a ver na escola apenas ‘o meio inventado pela burguesia para adestrar e normalizar o povo’(...) Nos anos 80, que assistiram em vários países, à comemoração das grandes leis que impuseram, no fim do século XIX, a obrigatoriedade escolar, essa mesma escola foi, pelo contrário, reabilitada como um triunfo ao mesmo tempo técnico e cívico, fruto da imposição segura de uma pedagogia normativa (Julia, 2001, p. 11-12).
Em um e outro caso, afirma Julia, as visões sobre o objeto escola são idênticas: uma instituição “todo poderosa, onde nada separa intenções de resultados” (idem, p. 12). Nos anos 1990, em contrapartida, ganha corpo uma orientação de pesquisa em educação mais internalista, produzida no ambiente da História sócio-cultural (ou História cultural, simplesmente). Trata-se da História das disciplinas escolares, que leva em conta as “resistências” e as “tensões” no momento de implantação dos projetos pedagógicos na escola.
Ela tenta identificar, tanto através das práticas de ensino utilizadas na sala de aula como através dos grandes objetivos que presidiram a constituição das disciplinas, o núcleo duro que pode constituir uma história renovada da educação. Ela abre, em todo caso, para retomar uma metáfora aeronáutica, a “caixa preta” da escola, ao buscar compreender o que ocorre nesse espaço particular (Julia, 2001, p. 13).
Em Viñao Frago, intelocutor espanhol bastante próximo à historiografia francesa sobre o tema, a periodização é a mesma. Antes dos anos 1970, afirma o autor, as normatizações sobre a escola são a preocupação dos historiadores da educação. Nas décadas de 1970 e 1980, entretanto, vigora a idéia de escola como um aparato de reprodução social, e, em meados de 1990, projeta-se o olhar inquiridor para o interior da escola:
[...] se insiste, y com razón, em que uma de las “cajas negras” de la historiografía educativa es la “historia de la realidad cotidiana de la educación, el “contenido” y “naturaleza interna de la educación” o, bajo uma denominación más amplia que comparto, la “cultura escolar” (Frago, 1998, p. 168).
Para Jean Hébrard (1999) e Anne Marie-Chartier (1999), embora sem delimitações rígidas, três orientações destacaram-se no território francês ao longo dos últimos quarenta anos. Em primeiro lugar, uma História da educação “dedicada aos aspectos políticos da evolução dos sistemas escolares” – a exemplo de Antoine Prost. No final dos anos 1960, a escola é “estigmatizada sociologicamente” como reprodutora da ideologia da classe dominante. O contexto da pesquisa sobre educação é constituído pelas reformas ocorridas entre as décadas de 1960 e 1980, nos programas de ensino, desde a escola elementar até à formação de professores.
O debate atual – do final dos anos 1990 – é marcado pelo exame das relações entre os saberes eruditos e os saberes escolares, em versões intituladas como “transposição didática – Yves Chevallard – e História das disciplinas – André Chervel (Cf. Chartier, 1999, p. 116-118; Hébrard, 1999, p. 35-36).
Esse mesmo debate contemporâneo, especificamente no âmbito do Service d’Histoire de l’Educación do INRP, é classificado e exposto de maneira tripartite por Roger Chartier, como: Sociologia da educação, História do discurso e da norma pedagógica, e História das práticas pedagógicas (Cf. Chartier, 2000, p. 100-102).
No Brasil, nos últimos trinta anos, os pontos de emergência da historiografia da educação também carregam as marcas de algumas singularidades em relação aos lugares e os motivos de produção. A primeira delas é a secundarização da disciplina História da Educação nos cursos de formação de professores. Diferentemente da Sociologia e da Biologia, a História era considerada uma ciência auxiliar na “Ciência da Educação”. Tal condição aproximou esses escritos específicos à Sociologia isolando a História da Educação em relação aos historiadores por formação – que, por sua vez, não tinham a educação como objeto relevante de pesquisa (Cf. Lopes & Galvão, 2001, p. 27; Bontempi Júnior, 2000, p. 43-46).
Um dos primeiros marcos anunciadores de mudanças no status da disciplina e na história dessa historiografia pode ser localizado no seminário organizado pelo Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos – INEP, intitulado História da Educação (1984), onde os parâmetros da crítica aos modelos precedentes (azevedianos e marxistas) começaram a ser esboçados por Mirian Warde e Jorge Nagle. No mesmo ano, instalou-se na VIII Reunião Anual da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação – ANPEd o primeiro Grupo de Trabalho sobre História da Educação, contribuindo, ainda mais, para o reforço da identidade do campo (Cf. Carvalho, 2000, p. 927-928).
Análises historiográficas foram empreendidas. O exame da produção vinculada aos Departamentos de Educação e programas de Pós-graduação permitiu que Mirian Warde (2000) esboçasse um “mapa conceitual e metodológico” que pode ser indicativo de uma futura periodização para o campo no Brasil. Ao examinar a produção das universidades de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, afirma a autora que o locus institucional imprimiu duas características relevantes: “a não profissionalização dos quadros educacionais para estudos de natureza histórica e a manutenção da História com disciplina complementar, depositária ou auxiliar de outras”.  Quanto às orientações teóricas, constatou-se a “preponderância do marxismo de tipo althusseriano” nos anos 1970, para quem a escola “havia sido ao longo do tempo e permanecia sendo um aparelho ideológico de Estado” (Warde, 2000, p. 5).
Nos anos 1980, verifica-se uma nova mudança com o acolhimento dos conceitos de Antonio Gramsci:
Esse autor foi apropriado como antídoto ao pessimismo paralisante de Althusser, posto que seus escritos (por suposto, pouco lidos, já que nos trabalhos da área são citados mais os seus comentadores) foram interpretados como sinais otimistas de construção de uma nova ordem que poderia emergir sem revolução e com papel ativo dos intelectuais e dos educadores em geral (Warde, 2000, p. 5-6).
Nos anos 1990, incrementa-se a crítica às abordagens marxistas com base nos novos objetos e abordagens carreados pelos pesquisadores estrangeiros – sobretudo, franceses – ligados à Nova História Cultural, o que leva a autora a concluir que “o elemento mais peculiar de fase recente da historiografia da educação diz respeito à reposição do interesse por práticas e materiais pedagógicos não considerados até há pouco” (Warde, 2000, p. 7).
A reflexão sobre essas novas possibilidades teórico-metodológicas foram estendidas entre os historiadores do campo no país. Isso se deu, principalmente, mediante a renovação dos quadros docentes e o incremento dos cursos de História da Educação em universidades formadores de opinião no país (Carvalho, 2000). Nesse movimento, já nos anos 1990, três orientações poderiam ser identificadas. A primeira relacionava História da educação e fontes históricas. A segunda punha em relevo a contribuição da antropologia, da psicologia, da lingüística, entre outras, com destaque para as idéias de Roger Chartier, uma das abordagens da História cultural francesa. A última orientação debruçava-se sobre o discurso historiográfico do próprio campo, a História da Educação no Brasil (idem, 2000, p. 929).[3]
No balanço de Carvalho (2000) sobre a trajetória da História da educação no Brasil, constata-se que tais orientações estão longe da hegemonia no campo. Todavia, apesar das ressalvas em relação à operação historiográfica, a conclusão da autora não é pouco otimista, já que
la fort présence de ces nouveaux thèmes et nouvelles approches dans la nouvelle prodiction d’histoire de l’édication donne à la discipline um nouveau statut dans le champ des sciences de l’education, et la libère de la fonction subsidiaire qu’elle y avait. La conséquence la plus significative de cette libération a été l’insertion de la recherche em histoire de l’éducation dans les domaines de l’investigation historiographique” (Carvalho, 2000, p. 929).
A emergência da “cultura escolar”
Os processos de reconfiguração do campo História da educação, na França e no Brasil, guardam algumas similitudes, como percebemos na exposição anterior. Entre as convergências destacadas no redesenho dos anos 1990, podemos citar a crítica aos modelos de inteligibilidade histórica de caráter generalizante – estruturais e/ou evolucionistas –, o deslocamento do olhar do historiador para “o que realmente aconteceu” – as práticas – e não para o que foi projetado – o prescrito na legislação e pelas normas escolares – ou o que deveria ter acontecido – a utopia do pesquisador sob a forma de uma filosofia da história. Em síntese, há uma significativa corrente de pesquisadores na História da educação que atribui centralidade à escola moderna[4] como objeto de análise, e ajusta as suas lentes para o interior dessa instituição, a chamada “caixa preta” da escola.
Esse tipo de abordagem, o estudo da escola pela sua internalidade, produziu uma expressão sintética, a “cultura escolar”. O termo ganhou visibilidade no Brasil sob a pena de Dominique Julia. Mas, Diana Vidal adverte:
Talvez, por que difundido no prestigioso fórum do ISCHE, o texto de Dominique Julia, publicado em 1995 na Paedagogica Historica e traduzido para o português em 2001, pela Revista Brasileira de História da Educação, servindo de artigo de abertura ao primeiro número do periódico, tenha sido insistentemente citado tanto nas investigações estrangeiras como nacionais. O debate em torno da “cultura escolar”, entretanto, é-lhe anterior (Vidal, 2002, p. 1).
A anterioridade referida por Diana Vidal nos remete ao debate dos anos 1980 entre André Chervel que “advogava a capacidade da escola produzir uma cultura específica, singular e original” e os adeptos da transposição didática – o entendimento de que a disciplina resultaria da migração/simplificação dos saberes eruditos/científicos – Yves Chevallarde Jean-Claude Furquin.
A proximidade dos artigos de Chervel e Julia repousava menos na ênfase na originalidade da “cultura escolar” e mais na recusa a uma historiografia educacional que ao estudar a escola pela sua externalidade, insistindo na importância dos textos legais e sobrevalorizando projetos e modelos, negligenciava as práticas escolares (Vidal, 2002, p. 2).
Para a mesma autora, as formulações de Julia e Chervel, procuravam de uma certa maneira, “ampliar as investigações alicerçadas na noção de “forma escolar”, tramada por Guy Vicent nos anos 1980” e difundida no Brasil em 2001. A chave de entrada no objeto escola, entretanto, diferenciava-se nos três autores. Enquanto Chervel e Julia abordavam as disciplinas escolares, Vincent preocupava-se com “as relações entre mestre e escolar em um espaço e tempo normatizados” (Vidal, 2002, p. 2).
Mais que uma categoria, como pensa Vidal, a “cultura escolar” foi vista também com um “programa de pesquisa do qual emergem e entrecruzam-se outros campos de investigação e temáticas, tais como: história da leitura, das disciplinas escolares, do currículo, da profissionalização docente, da alfabetização, dos métodos de ensino, entre outros”. Assim, na visão de Rosa Fátima de Souza (2000, p. 5), a análise da “cultura escolar” deve incorporar os conceitos de representação – de Chartier – e de apropriação – de Michel de Certeau – e levar em conta os seus principais elementos constitutivos: o espaço escolar, as disciplinas escolares – explorados por Chervel, Hébrard e Julia – , os currículos – Goodson, Kliebard, e Cunninghan – e a normatização e distribuição do tempo – Compère, Escolano, e Hall (Cf. Souza, 2000, p. 5-10).
Nesse rastreamento, outro nome deve ser levado em conta. Trata-se de Antonio Viñao Frago que, principalmente, no texto “Por uma historia de la cultura escolar: enfoques, cuestiones, fuentes” apresenta um sentido mais ampliado para a expressão em foco: “La cultura escolar es vista como um conjunto de teorías, principios  o criterios, normas y práticas sedimentadas a lo largo del tiempo em el seno de las instituciones educativas” (Frago, 1998, p. 168-169). O núcleo da expressão acompanha as formulações de Julia. A cultura é vista como “modos de pensar y actuar que proporcionan estrategias y pautas ..”. O status do termo, todavia, ganha nova dimensão. Além de distinguir sub-culturas – acadêmica e professoral, dos alunos, dos pais etc. – o autor propõe um programa de trabalho que se confunde com o próprio campo História da Educação.
Enfim, seja como objeto, categoria ou como programa de pesquisa, o fato é que os empreendimentos historiográficos centrados na “cultura escolar” migraram dos congressos internacionais para alguns programas de pós-graduação em universidades situadas em São Paulo e Minas Gerais (Cf. Munakata, Warde e Carvalho, 2001; Veiga, Gouvêa, e Faria Filho, 2001) e já produziu os primeiros frutos que dão visibilidade ainda maior ao termo (Cf. Souza e Catani, 1998; Souza, 1998 e 2000; Faria Filho, 2000; Camargo, 2000). O periodismo em forma de dossiê também já lhe abriu as portas (Cf. Cadernos CEDES, n. 52) e os congressos de especialistas como o III Luso-brasileiro – Coimbra, 2000 – e o II Congresso da SBHE – Natal, 2002 – concederam-lhes espaços privilegiados. Seria, portanto, mais que oportuno examinar, nesse momento, o papel que a expressão “cultura escolar” ocupa nos trabalhos produzidos sob a rubrica de História da Educação no evento nacional de maior significação na área, o II CBHE. Examinar a circulação de impressos e a apropriação de discursos periodicamente pode constituir-se uma contribuição importante para acompanhar-se o constante movimento de reconfiguração da História da Educação, seja como disciplina acadêmica, seja como campo de produção da escrita da história sobre educação no Brasil.

Cultura escolar no II CBHE
O conjunto analisado totaliza quinze trabalhos. São comunicações colhidas junto ao eixo temático “História de Culturas Escolares e Profissão Docente no Brasil”. O critério de seleção levou em conta os trabalhos que no título ou no corpo textual fizessem uso da expressão cultura escolar. A leitura preliminar resultou num conjunto de textos oriundos de pesquisas em desenvolvimento, fruto de teses e dissertações e de empreendimentos financiados pela Capes e CNPq. Os responsáveis são doutores, em sua maioria, vinculados às Universidades Federais de Pernambuco, Sergipe, Santa Maria, Minas Gerais, Pará, Paraná, Rio Grande do Norte e às Estaduais de São Paulo, do Rio de Janeiro, de Santa Catarina, e ainda, a Universidade Estadual Paulista (Campus de Marília) e o Centro Universitário Moura Lacerda (Ribeirão Preto). Os temas, da mesma forma que os lugares institucionais e geo-políticos de produção, variam bastante. Não há concentração sobre um determinado objeto da História da Educação. A cultura escolar aparece ligada à escola citadina, à educação feminina, técnica, infantil, primária, secundária, jesuítica, católica, como também aos problemas relativos à doutrina de higienização, às representações do professor, a História das disciplinas escolares e da imprensa, ao cotidiano, à disciplinarização, e à distribuição do tempo escolar.


Quadro n. 1 – Listagem dos trabalhos analisados

Autor
Título do trabalho
Carlos Monarcha
Cultura escolar urbana: São Paulo – 1840/1940
Eremilda Vieira da Costa
Cultura Escolar e a formação de meninas na Escola Normal rural Santa Maria (Timbaúba, 1938/1950)
Fábio Alves dos Santos
Formando técnicos e patriotas: a Revista Sergipe Artífice
Graziela Escandiel de Lima e Valeska Fortes de Oliveira
Professoras de educação infantil e suas histórias de vida: as brincadeiras revisitadas pela memória
Irlen Antônio Gonçalves
A produção da cultura escolar em Minas Gerais: práticas de professoras e alunos da escola primária
José Gonçalves Gondra
Higiene e cultura escolar
Marcus Levy Albino Bencostta
Memória e cultura escolar: a imagem fotográfica no estudo dos grupos escolares em Curitiba-PR (1903/1971)
Maria Antônia Teixeira da Costa e Betânia Leite Ramalho
Imagens de professor/a no Rio Grande do Norte nas décadas de 1930/1940
Maria Aparecida Junqueira Veiga Gaeta
Entre rendas e bordados: memórias de uma disciplina escolar
Maria Cristina Soares de Gouvêa e Fernanda Simões
A escolarização da criança: as diferentes infâncias no projeto educacional na Província mineira (1830/1892)
Marilda Iwaya
Os rituais e o cotidiano escolar – Instituto de Educação do Paraná Professor Erasmo Pilotto (1940/1960)
Norberto Dallabrida
Disciplina e devoção: o Ginásio Catarinense na Primeira República
Paula Sônia de Brito
Docência e culturas escolares em estabelecimento católico de Caicó-RN (1942/1946)
Rita de Cassia Gallego
“Muito ensino, muita instrução em diminutíssimo espaço de tempo”: um estudo das recomendações dirigidas aos professores primários acerca do melhor modo de “utilizar” o tempo (1902/1919)
Serlei Maria Fischer Ranzi e Maclovia Corrêa da Silva
A imprensa e a situação do ensino secundário no Paraná (1891/1925)
Fonte: Anais do CBHE, 2002.
A análise pautou-se no exame de duas questões básicas: qual a definição empregada e que uso faz da expressão cultura escolar. Do grupo de quinze trabalhos, em relação à primeira pergunta, cinco respostas foram colhidas. Cultura escolar é: o “fazer” da escola (4); temática, campo, objeto de pesquisa (4); categoria e conceito (2); e uma abordagem pertencente à História Cultural. Mas, há também comunicações que utilizam a expressão sem apresentar definição alguma. Os autores que assim procedem (Ranzzi e Silva, Golvêa e Simões, Costa e Ramalho, e Bencostta) tematizam, respectivamente, hábitos e práticas, a invenção do aluno, as imagens do professor nas metáforas de artigos jornalísticos, e o uso de imagens fotográficas como curso metodológicos para a História da Educação. Nesses últimos trabalhos, a expressão “cultura escolar” serve como um locus de estudos aparentemente já legitimado pela comunidade de pesquisadores sobre educação com o qual as comunicações viriam contribuir – no caso das imagens fotográficas  ou, simplesmente, no qual seria justificada a construção do objeto – imagem do professor. No trabalho com as metáforas, há também a preocupação de citar autores envolvidos na questão: “o estudo parte do referencial memória e profissionalização docente discutido por Catani (1997); Bueno (1997); Nóvoa e Finger (1989); Ramalho (1993). Parte, ainda, do referencial sobre cultura escolar tratado por Viñao Frago (2001); Dominique Julia (2001); Gauthier (2000)” (Cf. Costa e Ramalho, 2002, p. 3). Mas, no texto sobre imagens fotográficas, a referência é lacônica: “O uso de imagens fotográficas... tem demonstrado potencial analítico suficiente para colaborar na busca e organização de compreensões e explicações acerca da cultura escolar manifestada nos ambientes em que ela interage” (Bencostta, 2002, p. 1). A intervenção por aí se encerra, sem apontar autores que se ocupam ou teorizam sobre “cultura escolar”.
Os dois textos restantes não referenciam Julia, Frago ou qualquer outro. Nem mesmo nas referências bibliográficas. Todavia, através dos objetos, é possível perceber filiações correntes. Em “A imprensa e a situação do ensino secundário no Paraná (1891/1925)”, a cultura escolar ganha significado como hábitos e práticas de dirigentes escolares. Em relação ao título “A escolarização da criança: as diferentes infâncias no projeto educacional na Província mineira (1830/1892), a cultura escolar é a prática, o fazer da escola direcionado para uma formação específica – a educação feminina. A construção do aluno, é examinada pelas autoras por intermédio da estruturação de “tempos e espaços múltiplos de escolarização, tendo em vista o perfil da criança-aluno (a)” (Golvêa e Simões, 2002, p. 2).
Dos que definem cultura escolar, o único a concebê-la explicitamente como uma “abordagem” da História Cultural francesa foi Maria Aparecida Junqueira Veiga Gaeta que estudou o ensino de “Rendas e Bordados” – trabalhos manuais – como disciplina escolar. A definição acompanha as proposições de Dominique Julia, tanto para a História das disciplinas (2002), como para a cultura escolar (2001). Assim, a expressão sintética abarca a história das práticas de ensino, mas não chega a fundar um campo autônomo, já que é tributária do redesenho do campo dos historiadores por formação inicial, na França dos anos 1980:
O horizonte teórico que norteia a investigação baseia-se nas tendências historiográficas produzidas pela Nova História Cultural, que permitem a percepção de que a cultura escolar possui um estatuto próprio de transformação, situando-se no mesmo patamar que as lutas políticas e econômicas: nem acima nem abaixo das relações econômicas e sociais e nem alinhadas a elas, conforme enfatizou Chartier (1990)[5] (Gaeta, 2002, p. 3)
Aqui, o que tem relevo é o novo lugar da expressão cultura como elemento de inteligibilidade histórica. Essa problematização encerra-se nesse ponto. No texto, cultura escolar é o locus acadêmico no qual está inserido o estudo sobre a disciplina “trabalhos manuais”.
O primeiro grupo majoritário (quatro trabalhos) compreende cultura escolar como a vivência, a experiência interna à escola, o fazer da escola, o que se produz dentro da escola. Os elementos constituintes dessa cultura são a distribuição do tempo e do espaço escolares, os sujeitos, as práticas, as regras, os instrumentos de controle e disciplinarização dos alunos. Em tal sentido, ganham relevo as formulações produzidas por Julia (1995) e a idéia de forma escolar de Guy Vincent (2001). Os pesos da expressão, todavia, são diferenciados. Em “Disciplina e devoção: o Ginásio Catarinense na Primeira República”, a preocupação de Norberto Dallabrida foi compreender o funcionamento de estratégias e táticas de controle/vigilância implementados na referida instituição. No exame, ganham destaque as questões relativas ao tempo, espaço, disciplina e a organização do trabalho do professor, a maquinaria escolar. A perspectiva foucaultiana o leva a concluir que
a maquinaria escolar jesuítica operava por incitamentos exaustivos, vigilância panóptica, exame contínuo, mas também por castigos, cuja função era normalizar. As punições faziam parte da lógica da cultura escolar disciplinarizante, pois, ao qualificar e classificar os alunos, a prática disciplinar produzia tanto a premiação como a punição (Dallabrida, 2001, p. 7).
Vemos que a relevância é atribuída ao qualificador (disciplinarizante) da cultura escolar. Esta não possui nenhum limite teórico declarado.
Para Graziela Escandiel de Lima, cultura escolar é também o fazer da escola. Mas, não há fundamentação teórica para a expressão. A cultura escolar aparece como elemento dado – constituído em si próprio. Com o texto “Professoras de educação infantil e suas histórias de vida: as brincadeiras revisitadas pela memória”, as autoras pretendem “conhecer as significações construídas ao longo de suas trajetórias pessoais e profissionais em relação ao brincar” (Lima e Oliveira, 2001, p. 1). Nos resultados do estudo, a cultura escolar é homogeneizada e, curiosamente, colocada ao lado de uma outra cultura – a cultura docente – expressando a experiência da Rede Municipal de Ensino de Santa Maria:
No decorrer de suas trajetórias, as significações construídas em torno das oportunidades lúdicas que tiveram, corroboraram para que pudéssemos salientar que a cultura da escola não objetiva o brincar como manifestação humana, não reconhecendo estes momentos como construções necessárias à criança e ao professor.
Ainda sobre cultura escolar, podemos dizer que esta, e também a cultura docente, encontram-se impregnadas pelo ideal moderno de produção, onde parar para refletir e produzir(se) na profissão está contrariando a lógica da produção em série, produção de bens, de capital (Lima e Oliveira, 2002, p. 4).
As duas últimas comunicações que definem cultura escolar como o fazer da escola refinam a discussão. Marilda Iwaya estuda “os rituais e o cotidiano escolar”. Nesse trabalho, “a exigência do uniforme, a formação de filas antes de entrar nas salas, o controle de horários, as punições, são elementos que vão compor parte da cultura escolar das instituições de ensino em geral” (Iwaya, 2002, p. 9). Portanto, e com tais elementos, é preciso convocar as orientações de Viñao Frago e Escolano.
O mesmo cotidiano é reivindicado por Irlen Antônio Gonçalves que estudou “A produção da cultura escolar em Minas Gerais: as práticas de professoras e alunos da escola primária”. Para ele, “o intento de compreensão da cultura, a partir das práticas escolares das professoras e alunos, implica em trazer como problematização central e geral as questões relacionadas à constituição da cultura que emerge no dia-a-dia da escola primária. Pois será nesse cotidiano que as ações dos sujeitos serão inventadas...” (Gonçalves, 2002, p. 1). O autor também passa em revista a produção de europeus que tematizam cultura escolar, definindo, tanto os “elementos que podem ser considerados centrais na composição do fenômeno educativo – tempos, espaços, saberes, sujeitos, e a materialidade das práticas escolares”, como as principais dimensões por onde se encaminham os estudos sobre a matéria – as estratégias de imposição e o cotidiano escolar, em outras palavras, o prescrito e o acontecido. Estabelecidos os elementos do fenômeno educativo e as dimensões do estudo, Gonçalves apresenta os conceitos de tática e apropriação como os principais instrumentos interpretativos para o conhecimento do que realmente aconteceu dentro da escola.  Assim, cultura escolar e prática escolar são expressões sinônimas. Elas transformam-se de vigência cotidiana da escola em objeto de pesquisa privilegiado para o historiador da educação. O fragmento abaixo sintetiza bem o uso dado à expressão:
[...] é possível constatar a pertinência de que o espaço do não-lugar, ocupado pelos sujeitos escolares, as apropriações e as representações que fazem das prescrições e os usos que são postos a circular e, ainda, as outras práticas que são inventadas cotidianamente por diretores, professores e alunos permitem perceber como a cultura escolar vai sendo tecida lentamente no interior do cotidiano da vida escolar (Gonçalves, 2002, p. 11).
Um terceiro grupo de trabalhos selecionados concebe cultura escolar estritamente como campo e temática de investigação. É o caso de Fábio Alves dos Santos que estuda a Revista Sergipe Artífice e identifica nesse periódico uma rica fonte de propaganda e legitimação, tanto da instituição escolar como do Estado. Cultura escola é o locus científico do qual faz parte o exame desse impresso, sobretudo porque a Revista produz representações sobre o cotidiano da Escola de Aprendizes e Artífices de Sergipe. A idéia de cultura escolar está ancorada em Julia (2001). No sentido inverso, mas dentro da mesma direção, operou Eremilda Vieira da Costa. Julia é também a orientação de base. Em “A cultura escolar e a formação de meninas na Escola Normal Rural Santa Maria (Timbaúba – 1838/1950)”, Eremilda parte do objeto privilegiado – cultura escolar – para os seus constituintes: “a história do estabelecimento, as normas e finalidades, a profissionalização do educador, os conteúdos do ensino, a educação da mulher e as práticas escolares” (Costa, 2002, p. 1). O trabalho está em andamento, mas o objeto parece ainda pouco nítido, já que a meta da autora é “entender como essa cultura foi repassada e de que forma foi vivenciada” (idem, p. 1). Isso sem falar dos desequilíbrios entre os “elementos constituintes” da cultura escolar acima citados.
“Docência e culturas escolares em estabelecimento católico de Caicó-RN (1942/1946)” também concebe a expressão como uma temática de investigação. Sua autora, Paula Sônia de Brito, aproxima-se do programa de pesquisa proposto por Julia. Entretanto, apesar de listar a bibliografia pertinente – Frago, Faria Filho, Julia entre outros – Sônia Brito entende os estudos sobre a produção docente como situados fora do âmbito da cultura escolar, à qual ela pretende congregá-los.
O último texto que define cultura escolar como campo privilegiado de investigação foi produzido por Carlos Monarcha. É um trabalho heurístico, um projeto que tem por fim a elaboração de repertórios de fontes documentais. Daí, a compreensão do campo de pesquisa estar subordinada à classificação dos temas abrangidos pelo projeto, quais sejam: 1. Organização do aparelho escolar; 2. Fundamentos teórico-práticos da educação institucional; 3. Revistas de educação e ensino (séries); 4. Condições de vida e trabalhos de professorado; 5. Condições de vida dos contingentes de alunos; 6. Tradições escolares e acadêmicas; 7. Depoimentos, literatura de ficção, biografias e memórias (Cf. Monarcha, 2002, p. 4). Nesse projeto, a cultura escolar está delimitada pela ambiência do urbano – cultura escolar urbana.
Por fim, cabe comentar os dois textos que tratam da expressão cultura escolar como um conceito. Rita de Cássia Gallego entende cultura escolar como um conceito, á maneira de Julia. Em “Muito ensino, muita instrução em diminutíssimo espaço de tempo” ela busca apreender “o processo de construção da arquitetura temporal das escolas públicas primárias de São Paulo, no período compreendido entre 1890 e 1929” (Gallego, 2002, p. 1). Os outros instrumentos conceituais para o desvelamento dessa cultura escolar são a idéia de forma escolar – Guy Vincente – e de tática e estratégia – M. Certeau.
José Gonçalves Gondra partilha de uma concepção de escola interagente com outros ambientes de sociabilidade e não como um simples aparelho reprodutor. Mas, a cultura escolar, tomada como conceito/categoria ao modo de Chervel e Julia, é problematizada em dois níveis. O primeiro, trata da relação natureza-cultura, e o segundo, discute a possibilidade da produção de culturas distintas – a escolar e a não escolar. O autor constata a inexistência de consenso em relação aos termos e sugere o enfrentamento dessa questão. Isso deve ser feito, afirma Gondra, para que se possa, em primeiro lugar, “evitar a idéia de universalidade do conceito e, segundo, evitar sua banalização que, do mesmo modo que o efeito anterior, pouco ou nata contribui para aprofundar a compreensão dos fenômenos que desejamos conhecer para neles melhor interferir” (Gondra, 2002, p.2). Assim, o autor faz opção pela abordagem de Clifford Geertz – a descrição densa em relação à cultura – que o conduz às seguintes conclusões acerca da relação “Higiene e cultura escolar”, também título do trabalho:
[...] é possível detectar  traços da doutrina higienista acionados para definir a idade mínima de ingresso dos alunos, distribuição do tempo, desenvolvimento da inteligência e de outras rotinas da organização escolar (...). [Dessa forma], trabalhar com a idéia da construção de uma “cultura escolar” que forja princípios próprios conduz, igualmente, à necessidade de não perder de vista a tese de que a escola não funcionou (e não funciona) apenas como instância de aplicação de regras e princípios de outras esferas de governo da sociedade, sendo igualmente alvo de projetos de modelação forjados no seu exterior (Gondra, 2002, p. 8)[6].


Conclusão
Vimos, portanto, que a escrita da História da educação no Brasil, vinculada à pesquisa universitária brasileira vem ganhando novas formas nos últimos dez anos. Entre as modificações, ressaltou-se a convergência para o exame do objeto escola e das práticas forjadas no seu interior – ainda que mediadas pelo seu entorno. É corrente minoritária, certamente, mas que começa a requisitar uma expressão sintética como elemento de identidade, a cultura escolar.
Vimos também que essa expressão, veiculada nos trabalhos apresentados em eixo específico – “Culturas escolares e profissão docente no Brasil – foi definida a partir de orientações que vão do status epistemológico – uma abordagem da História cultura; ao âmbito etodológico – uma categoria, um conceito, um tema, um objeto de pesquisa. Na maioria dos casos, independentemente da tipologia exposta acima, cultura escolar foi implicitamente definida por seu substantivo base, a cultura, seja em termos do binômio individual-coletivo –, aí, cultura escolar toma o sentido de modos padronizados de pensar, agir, e sentir –, seja na problematização mais antiga que envolve a oposição entre o dado e o feito, entre natureza e cultura. Nesse último caso, cultura escolar diz respeito a tudo aquilo que foi produzido na instituição ou através dela.
Esse tipo de problematização recebe apenas os seus primeiros influxos. Decerto, em trabalhos dessa natureza – comunicações de pesquisas – é pouco provável que os apresentadores se preocupem com maiores justificativas sobre a “operação historiográfica” empreendida. Entretanto, os indícios dos usos da expressão cultura escolar podem tornar-se loquazes se comparados sistematicamente nas próximas edições do CBHE. Por hora, apenas mapeamos atitudes, que não necessariamente se encontram em estado puro nos trabalhos analisados. A primeira indica um grande esforço dos pesquisadores por vincular a sua prática de pesquisa ao considerado “novo” em historiografia educacional. E o novo em questão é a temática da cultura escolar. Essa atitude não os obriga, em alguns casos, a definir a expressão ou situar a sua pesquisa no campo, em termos conceituais. Por essa perspectiva, a cultura escolar, simplesmente, existe, restando aos autores tomá-la como campo de partida ou de chegada. A segunda atitude é de denúncia. Cultura escolar é o locus privilegiado para identificar o controle social, mediado pela higiene, disciplina, religiosidade etc. A terceira, além de identificar o controle, utiliza-se de um agregado de conceitos, sintetizados na rubrica “cultura escolar”, para demonstrar as resitências dos atores envolvidos com a escola, ante as imposições de natureza vária.
Intrigante essa observação sobre os trabalhos examinados. Pareço estar fazendo uso do método filogenético para a compreensão das práticas da escrita em História da educação. Por tal instrumento do século XIX, a escrita do momento, sob determinada tendência, estaria a reproduzir as etapas fundamentais da “evolução” do campo – a trajetória de um homem reproduz o percurso da espécie. Aliás, eu não seria o primeiro a concluir por esse caminho. Sem a mesma “dose de fantasia”, Marcus Taborda de Oliveira (2002) já havia afirmado algo parecido em relação aos escritos sobre cultura escolar: a pesquisa parece estar em frente a uma bifurcação: ou entende a escola como determinada pela cultura ou como um elemento resistente à cultura exterior. A solução para o dilema? Somente uma: “O pensamento de Edward Palmer Thompson como programa para a pesquisa em História da educação”. Segundo Oliveira, é a idéia de experiência que tem que ganhar relevância. Tem que se observar as “motivações” dos diferentes atores, já que as suas reações não significam nem “adesão cega”, tampouco “resistência  consciente e ativa” (Cf. Oliveira, 2002, p. 7-8).
Ao optar por Thompson, Taborda acaba fazendo uma leitura “epistemológica” da cultura escolar. Ela já aparece como “coisa” dada. Taborda, praticamente, reivindica a originalidade e a primazia dos estudos no campo/temática para o historiador inglês. Perdeu um bom momento para confrontar as noções de cultura em disputa e, por consegüinte, fazer a defesa dos postulados thompsianos. A minha posição é, por enquanto, muito mais cautelosa. Segue, de perto, as considerações de Marta Carvalho, uma das responsáveis por essa salutar (des)organização do campo. Em História da educação, como em qualquer outra seara do trabalho acadêmico, a apropriação de novos “problemas, objetos e abordagens”, oriundos da comunidade francesa, inglesa, espanhola ou norte-americana, tem que ser orientada, primeiramente, no sentido de inspirar à construção do nosso questionário de pesquisa e de tornar muito mais criativa a nossa relação com o objeto e o diálogo com as nossas fontes e não, simplesmente, significar uma adoção literal do modelo, transformando a pesquisa educacional brasileira, apenas, num campo de testes de hipóteses produzidas a partir de problemáticas eminentemente francesas, por exemplo.


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Notas
[1] Autores legitimados na comunidade científica brasileira pelo espaço que ocupam nos programas de pós-graduação, na disciplina História da Educação, oferecida nos cursos de graduação, e organizados numa entidade de caráter nacional que, por sua vez articula-se com outros com outros centros que tratam da matéria no exterior, a Sociedade Brasileira de História da Educação – SBHE.
[2] Texto apresentado por Itamar Freitas à disciplina Historiografia e História da Educação e da Cultura II, ministrada pela profa. Dra. Marta Maria Chagas de Carvalho, no período 2002/2.
[3] Para uma abordagem sobre a relação entre os campos da História cultural  e da História da educação ver Sérgio Castanho (2000).
[4] Escola moderna no sentido atribuído por David Hamilton (2001).
[5] O texto citado é a História cultural: entre práticas e representações. Lisboa: Difel, 1990.
[6] “O exercício ora desenvolvido, nos limites dese trabalho, sugere que a doutrina da higiene não ficou contingenciada ao ambiente da corporação médica. Circulou amplamente, tendo sido apropriada no circuito da organização escolar pelo código jurídico-normativo, em teses de professores e de diretores, por exemplo. Voltou-se para as escolas regulares, estendendo-se igualmente os estabelecimentos destinados a recolher e educar os pobres da cidade. Sinais de legitimidade obtida. Com isso, a instituição médica fornece fortes evidências de que alcançava o direito de governar instituições outras que inscrevia em seu horizonte de dominação, nesse caso, a organização escolar, cujo resultado teria sido a produção de uma “cultura” peculiar” (Gondra, 2001, p. 8).

Para citar este texto
FREITAS, Itamar. Usos e abusos da cultura escolarTexto apresentado por Itamar Freitas à disciplina Historiografia e História da Educação e da Cultura II, ministrada pela profa. Dra. Marta Maria Chagas de Carvalho, no Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação (História, Política, Sociedade), no período 2002/2.São Paulo, 2003. <http://itamarfo.blogspot.com/2010/10/usos-e-abusos-da-cultura-escolar.html>.