O projeto
O periódico revista e um tipo de impresso[1] que “como o nome sugere, passa em revista diversos assuntos (...) que permite um tipo de leitura fragmentada, não contínua, e por vezes seletiva”[2].
Tanto em relação à forma quanto ao conteúdo, está a “meio caminho” entre o jornal e o livro. Essa “função” intermediária que dificulta a sua identificação, talvez tenha pesado no relativo esquecimento a que tem sido relegado esse tipo de impresso.
O Projeto “Catálogo das Revistas Sergipanas” tem por objetivo elaborar uma obra de referência sobre periódicos (ativos ou inativos) que ofereçam contribuição significativa para o estudo da história de Sergipe. Disponibilizar à comunidade de pesquisadores um novo estoque de fontes que estava em desuso apenas pelo desconhecimento dos acervos.
Os trabalhos foram iniciados setembro de 2001, sob a coordenação dos professores do Departamento de História da UFS, Jorge Carvalho do Nascimento e Itamar Freitas. Do projeto fizeram parte os alunos de licenciatura e História: Crislane Barbosa Rodrigues de Farias, Rita de Cássia Melo, Ana Lígia Rodrigues de Farias, Fábio Alves dos Santos e Fernanda Cordeiro de Farias e Elba Carla Maciel Santana.
A pesquisa compreende três etapas: inventário e catalogação das revistas; editoração dos sumários; e publicação da bibliografia comentada sobre a temática da educação veiculada em periódicos sergipanos.
Durante a primeira etapa, já concluída, foram visitadas vinte e duas instituições, bibliotecas em sua maioria, situadas em Aracaju, São Cristóvão e Maruim[3]. Os serviços incluíram o rastreamento de catálogos em base papel e catálogos eletrônicos. Na ausência desses instrumentos, providenciou-se uma busca exaustiva, estante por estante, dos periódicos que se enquadravam nos dois critérios fundamentais: terem sido produzidos em Sergipe e/ou produzidos em outros Estados, mas que tematizassem Sergipe e neste local tivesse circulação plena.
Resultados
O conjunto inventariado até janeiro de 2002 contabiliza cento e trinta e cinco títulos produzidos entre 1890, Revista literária, editada pelo Gabinete de Leitura de Maruim.
A maior parte desses títulos estão armazenadas nas instituições culturais de grande prestígio. Sob esse aspecto, o levantamento somente veio confirmar o que já era esperado. Assim, pertence à Biblioteca Pública Epifânio Dória o maior acervo, sessenta e quatro títulos, seguido do Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe sessenta, Biblioteca da UFS, setor de documentação sergipana, quarenta e quatro, Instituto de Educação e Cultura Tobias Barreto, trinta e seis, Memorial de Sergipe (Unit), vinte e três, Arquivo Público do Estado de Sergipe, vinte, e o Programa de Documentação e Pesquisa Histórica (PDPH), dezenove títulos.
Sobre a distribuição dos títulos lançados ao longo dos últimos cento e dez anos, quando a média de lançamentos ficou entre cinco e seis títulos, é possível visualizar um verdadeiro salto a partir dos anos 1970. Os anos 1980, com vinte e dois títulos e os anos 1990, com cinqüenta e quatro, representam uma verdadeira multiplicação desses periódicos, com a qual contribuiu bastante a especialização do saber acadêmico, bem como a ampliação do número de publicações corporativas.
Sob o ponto de vista dos “grupos de consumo”, é o segmento da ciência que lidera até o momento com trinta títulos. Dentro desse ramo, há uma grande dispersão entre geógrafos, historiadores, comunicólogos, economistas, cientistas sociais, especialistas em educação entre outros.
As revistas de “educação”
Terminado o balanço sobre o acervo inventariado, resta oferecer um panorama sobre os impressos relativos à educação. De início é preciso esclarecer que a classificação “impressos relativos à educação” obedece ao critério da pretensão editorial. Não se trata aqui de responder à questão de onde poder localizar a temática da educação. Esse tipo de resposta somente pode ser obtida a partir da análise de conteúdo, uma etapa que começa a ser experimentada com os alunos Crislane Barbosa Rodrigues de Farias, Ana Lígia Rodrigues de Farias, Fábio Alves dos Santos.
O problema aqui é identificar os títulos que se auto-referenciam como vetores da educação escolarizada.[4] Sob esse ponto de vista, podemos afirmar que são reduzidos os números. Apenas vinte e cinco compõem esse grupo, o que representa 19 % do total inventariado. Nesse conjunto, quatro são os tipos característicos: 1. revistas de Universidades e Faculdades isoladas e de cursos de nível superior; 2. revistas escolares (dos ensinos fundamental e médio); 3. revistas educação strico sensu (revistas que enfrentam questões pedagógicas e de história da educação).
O primeiro grupo reúne veículos institucionais como a Revista da Universidade Federal de Sergipe e a Fragmenta, revista da Universidade Tiradentes. Também fazem parte desse segmento as “revistas científicas” produzidas por cursos e faculdades que procuram legitimar e instituir um campo para os seguintes saberes: Direito (4), Geografia (3), Ciências Humanas (3), Economia (2), Filosofia (2), História (2), Comunicação (1), Ciências Sociais (1).[5] O traço distintivo desse subgrupo está na sua função: a divulgação do produto das pesquisas realizadas nessas áreas. No caso das revistas da UFS e da UNIT, é ainda mais presente a divulgação das atividades político-administrativas das referidas corporações. Nessas revistas, escola, educação, ensino e assuntos correlatos são tematizados de forma dispersa e minoritária.[6]
Do segundo grupo de revistas de educação fazem parte os títulos Sergipe Artífice (1934/1940) e Escola Técnica em Foco (1989). Ambas seguem o padrão dos periódicos de instituições universitárias, informando sobre a rotina administrativa da escola. Mas, ao contrário dos veículos das escolas do ensino superior, seus artigos, externam o grande interesse pelas questões didático-pedagógicas e profissionais. A primeira é veículo oficial da Escola de Aprendizes e Artífices de Sergipe. A segunda, veicula matéria da mesma escola em momento posterior: a Escola Técnica Federal de Sergipe é uma seqüência da Escola de Aprendizes de Artífices. Uma caracterização melhor dessa revistas vocês terão amanhã, através da comunicação do aluno Fábio Alves Santos.
O último segmento contempla as revistas que assumem a rubrica de “Educação”. Fazem parte desse terceiro subgrupo as revistas Educar-se e Hora de Estudo, produzidas pelas Secretarias de Estado e Municipal de Educação, respectivamente, e os veículos produzidos pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da UFS.
A revista Educar-se foi criada em 1996 e suspensa em 1999. A Hora de Estudo era fruto do trabalho desenvolvido pelo Grupo de Estudos e Pesquisas sobre a Memória do Ensino Público Municipal (1993), circulou entre 1997 e 2000[7]. Ambas aparentam ser, até o momento, as mais profícuas iniciativas em termos de estudos sobre educação escolarizada. Somente para exemplificar, pelo menos duas dezenas de artigos sobre a memória e a história da escola foram publicadas por esses periódicos. Nesses veículos, há informes sobre as atividades administrativas do Sistema e da Secretaria de Educação, respectivamente. A pesquisa também é ocupa um grande espaço. Entretanto, ao contrário dos títulos anteriormente citados (revistas de escola, cursos, faculdades e universidades), a atividade de pesquisa somente ganha sentido quando vinculada ao estudo a história das escolas, dos professores, das políticas públicas para a educação, o exame crítico da legislação, a crítica das práticas didático-pedagógicas e a avaliação de novas tecnologias aplicadas em uso na sala de aula.
A Revista do Mestrado em Educação foi lançada em 1998 para divulgar a produção discente e docente do Núcleo de Pós-Graduação em Educação, principalmente. O primeiro número veiculou, majoritariamente, matéria de pesquisa dos alunos e resumos de dissertações na área de educação. A Revista da Pós-Graduação UFS, apesar de apresentar-se como iniciativa dos mestrados em Desenvolvimento e Meio Ambiente, Geografia e Educação, teve circulação marcada por artigos sobre a relação entre a escola e o uso do computador. Dessa revista só há notícias do número 1, referente ao ano 1995.
Em síntese, as revistas que tematizam especificamente a educação surgiram de iniciativas institucionais. Não despertaram o interesse empresarial, mesmo daquelas escolas consideradas confessionais. Para o seu lançamento também não concorreram atos voluntaristas e a expressiva maioria teve origem no último quartel do século XX. A nota destoante desse periodismo é a constatação de que assim como surgiram quase ao mesmo tempo, começam a desaparecer ou simplesmente perder o ritmo. São os casos, infelizmente, das revistas que levam os nomes das Universidades sergipanas, dos cursos de História, Economia, Comunicação, e até mesmo as revistas especializadas mantidas pela Secretaria Municipal de Educação, Secretaria Estadual de Educação e do Mestrado em Educação da UFS. A revista Philosophica, ao que parece, foi a única a lançar novo número no ano passado.
Conclusão
O que se quis com essa comunicação foi atentar para a importância da revista como fonte privilegiada, não apenas para a compreensão da trajetória de alguns ramos do saber ou da memória de algumas instituições mas para o conhecimento das transformações sócio-culturais pelas quais passaram os diversos grupos que compuseram a sociedade sergipana nos últimos cento e dez anos. Principalmente dos grupos que hoje se interessam pelas temáticas relativas à educação em Sergipe.
Para citar este texto
FREITAS, Itamar. O Projeto “Catálogo das Revistas Sergipanas” e os impressos sobre educação . Comunicação apresentada durante o I Encontro Regional de Educação e IV Semana de Educação, promovido pelo NPGED/UFS. São Cristõvão, 2002.
Fontes das imagens
Notas
[1] Impresso: 1. que se fez por meio da imprensa; 2. qualquer obra impressa, como livro, folheto, opúsculo, folha volante, etc. Dicionário contemporâneo da língua portuguesa Caldas Aulete. 3ed. Lisboa: Delta, 1974. p. 1923. Impresso: 1. que se imprimiu; 2. produto das artes ou indústrias gráficas. Ferreira, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da língua portuguesa. 2 ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986. p. 925.
[2] Rocha, apud. Martins, Ana Luiza. Revistas em revista: imprensa e práticas culturais em tempos de República. São Paulo (1890/1922). São Paulo: FAPESP/EDUSP/Imprensa Oficial, 2001. p. 45
[3] APES – Arquivo Público do Estado de Sergipe; ASI – Associação Sergipana de Imprensa; ASL – Academia Sergipana de Letras; BICEN/UFS/CCSA; BICEN/UFS/DS – Biblioteca Central da Universidade Federal de Sergipe/Documentação sergipana; BICEN/UFS/HU; BICEN/UFS/NESA; BICEN/UFS/NPGED; BICEN/UFS/NPGEO; BICEN/UFS/NPGFI; BICEN/UNIT – Biblioteca Central da Universidade Tiradentes (campus 2); BICEN/UNIT – Biblioteca Central da Universidade Tiradentes (campus 1); BPED – Biblioteca Pública Epifânio Dórea; BTJ – Biblioteca do Tribunal de Justiça; FAF – Fundação Augusto Franco; FANESE - Faculdade de Negócios de Sergipe; FPX – Faculdade Pio X; FSL – Faculdade São Luis; GLM – Gabinete de Leitura de Maruim; IHGS – Instituto Histórico e Geográfico de Sergipe; LMC – Biblioteca da Loja Maçônica Cotinguiba; MEMORIAL/UNIT - Memorial de Sergipe/Universidade Tiradentes; PESQUISE – Instituto Cultural Tobias Barreto; SEPLANTEC – Secretaria de Estado de Planejamento; SINDIJOR – Sindicato dos Jornalistas de Sergipe
[4] Entendendo “educação” em sentido genérico: como processo “que consiste em que uma ou várias funções se desenvolvam gradualmente através do exercício e se aperfeiçoem” e como resultado desse processo. [cf. Lalande, André. Vocabulário técnico e crítico da filosofia. 3 ed. São Paulo: Martins Fontes, 1999. p. 287.] Recortando a definição, adotamos a educação como processo e como resultado ligados à escola, ou seja, um espaço permanente de “normalização cultural” que realiza a passagem “da turma informal e indisciplinada das ruas par a classe, organizada e atenta, por uma série de práticas, visando diminuir idiossincrasias e atenuar personalidades”. Cf. Souza, Maria Cecília Cortez Christiano de. Escola e memória. Bragança Paulista: CDAPH/Edusf, 200. p. 8
[5] Fazem parte desse grupo: Fragmenta (1998/2000), Revista da UFS (1979/1980), Cadernos UFS: História (1995/1997), Cadernos UFS: Extensão (1995/1996), Cadernos de Cultura do Estudante (1984/1999), Cadernos UFS: Direito (1999), Fragmenta (1984/1987), Revista do Curso de Direito da Universidade Federal de Sergipe (1991), Revista da Faculdade de Direito de Sergipe (1953/1971), Tomo (1998/1999), Cadernos UFS: Economia (1999), Cadernos UFS: Comunicação (1995), Cadernos do CECH (1992), Geotextos (1996), Geonordeste (1984/1999), Motrivivência (1989/?), Revista da Faculdade Católica de Filosofia (1961/1967), Hodos (2000), Philosophica (2001).
[v6] Para um maior conhecimento desses periódicos, sobretudo as chamadas “revistas científicas”, ver: Farias, Ana Lígia Rodrigues de; Santos, Fábio Alves dos. Revistas científicas sergipanas e sua contribuição para a produção do conhecimento histórico. Gazeta de Sergipe, Aracaju, 12 dez. 2001. Para conhecer o estado de conservação dos acervos ver: Azevedo, Crislane Barbosa de e Melo, Rita de Cássia. Catálogo das revistas sergipanas....Gazeta de Sergipe, Aracaju, 1 dez 2001.
[7] Cf. Nascimento, Jorge Carvalho do. Historiografia da educação em Sergipe: muito por fazer. Gazeta de Sergipe, Aracaju, ...2001.